sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Que critérios para o direito à saúde?

A bolsista pibic/Ibmec Daniela Pessanha envia-nos essa matéria publicada no jornal O Valor Econômico do dia primeiro de agosto de 2008 a respeito do direito à saúde (medicamentos). Percebe-se a dificuldade óbvia de estabelecer um critério norteador para a concessão desse direito. A saída estaria num processo coletivo como já está sendo tentado, por exemplo, no Estado do Rio de Janeiro juntadmente com sua Defensoria Pública?

STF definirá destino da avalanche de liminares contra SUS na Justiça
Luiza de Carvalho

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidirá o rumo das milhares de ações propostas por pacientes contra Estados e municípios pelas quais pedem o fornecimento de medicamentos de alto custo, conhecidos como excepcionais. A corte reconheceu a repercussão geral do tema - condição para o julgamento do processo em razão do seu impacto econômico e jurídico, por exemplo - em um recurso do Estado do Rio Grande do Norte. No processo, o Estado contesta uma decisão do Tribunal de Justiça da região para o fornecimento de medicamentos de alto custo a uma paciente. Nesse caso, o ministro Marco Aurélio de Mello, relator do recurso, considerou que está em jogo - ante limites orçamentários e a necessidade de muitos por medicamentos - a própria eficácia da atuação estatal.

De fato, as inúmeras ações que tramitam no Judiciário influenciam o sistema financeiro dos Estados e municípios, a partir dos bloqueios judiciais realizados no orçamento das secretarias de saúde. Em Minas Gerais, por exemplo, foram 390 ações do tipo em 2004, e 1.744 no ano passado. A estimativa do Estado é ter um gasto de R$ 40 milhões neste ano com o pagamento de medicamentos reivindicados por meio das ações judiciais.

Os pedidos realizados na Justiça se baseiam no artigo 196 da Constituição Federal, que prevê ser o direito à saúde um dever do Estado. De acordo com o procurador do Estado do Rio Grande do Norte, Cristiano Feitosa Mendes, que atua no caso a ser julgado pelo Supremo, a Justiça tem acatado de forma maciça esse argumento. Em grande parte do país, as secretarias da saúde têm lutado contra essa realidade.

Desde março, a Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro tem fechado acordos com a Defensoria Pública - que são parte em cerca de 90% dessas ações judiciais -, para que, em casos que pleiteiam medicamentos que estão na lista do Sistema Único de Saúde (SUS), o órgão oficie a secretaria antes de tentar a via judicial. Além disso, o Estado conseguiu regularizar vários estoques de medicamentos. O programa de fornecimento de medicamentos de alto custo do Estado tem hoje 20 mil pacientes cadastrados, e atendeu, em 2008, 30% a mais do que no ano anterior. Ainda assim, os gastos com ações judiciais continuam a aumentar - em 2005, o órgão usou R$ 5 milhões para esse fim, enquanto que em 2008 a previsão é de R$ 30 milhões. "O problema é o grande número de ações represadas", diz Pedro Henrique Di Masi Palheiro, subsecretário jurídico da secretaria. Segundo ele, com esses R$ 30 milhões poderiam ser abertas 25 unidades de pronto-atendimento 24 horas, destinadas a casos menos graves - atualmente, o Estado conta com nove unidades.

A Secretaria de Saúde do Rio Grande do Sul adota uma estratégia similar a do Rio para reduzir a "judicialização" na saúde. Segundo Bruno Naldorf, coordenador da assessoria jurídica da secretaria, desde o ano passado os estoques de medicamentos estão regulares e o órgão tem conseguido mais recursos na área, por meio de melhores oportunidades de compras. Após um trabalho com o Judiciário, diz Naldorf, o Estado começou a obter decisões favoráveis, principalmente nos casos oncológicos que, segundo ele, têm sido a maior demanda. O Rio Grande do Sul é um dos campeões do país em bloqueios orçamentários - o Estado gasta uma média de R$ 6,5 milhões por mês com o cumprimento de decisões judiciais. Em 2007, o Estado enfrentou 7,9 mil ações judiciais e, neste ano, já são 4,5 mil.

Ao que se sabe São Paulo é o Estado que mais gasta com o fornecimento de remédios via judicial. Desde 2002 foram ajuizadas 25 mil ações. Para Luiz Duarte de Oliveira, procurador do Estado responsável pela área, a maioria das ações não tem razão de existir. Segundo ele, há centenas de processos pedindo o fornecimento de fraldas. O procurador afirma que o gasto per capita de pacientes atendidos judicialmente é muito mais alto do que aqueles que buscam o SUS - em 2006, por exemplo, foram gastos R$ 300 milhões com ações judiciais, ao passo que o programa de dispensação de medicamentos excepcionais do Estado atendeu a 300 mil pessoa, com um custo de R$ 838 milhões. "O Poder Judiciário tem privilegiado quem primeiro aporta na Justiça, e não no sistema de saúde", diz.

Nos últimos anos, a preocupação se estendeu a alguns Estados que não possuíam quase nenhuma demanda na área. Em 2004, havia 390 ações do tipo em Minas Gerais e, em 2007, o número saltou para 1.744 - R$ 164 mil foram gastos pela Secretaria em 2002, e para 2008 a estimativa é de R$ 40 milhões. De acordo com Jomara Alves, subsecretária de inovação e logística da secretaria do Estado, está sob investigação no Ministério Público um possível conluio de médicos, laboratórios e advogados para forçar ações do tipo - investigações similares estão em curso em diversos Estados. "Por que conceder a última novidade do mercado quando há outras alternativas mais baratas?", questiona Jomara. A Bahia é outro Estado que tem tido grande crescimento das ações: em 2003 foram apenas seis processos do tipo no Estado e no ano passado foram 112.

No entanto, enquanto os Estados alegam que há uma "judicialização" excessiva, algumas associações de pacientes reclamam que não há medicamentos disponíveis. "A maioria dos medicamentos para câncer não consta na lista do SUS", afirma Maria do Rosário Costa Mauger, da Associação Brasileira de Pacientes com Esclerose Sistêmica. Já para Sérgio Sampaio, presidente da Associação Brasileira de Assistência a Mucoviscidose, que auxilia pacientes com fibrose cística, é possível evitar os processos. Segundo ele, por meio de ações junto às secretarias estaduais foi possível regularizar o fornecimento de medicamentos e forçar a criação de leis estaduais com essa finalidade.

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