Além dos pontos já destacados pelo Prof. Ribas, nota-se uma defesa do positivismo jurídico. Ainda no início do voto, o Min. Eros Grau faz uma crítica irônica dos “ neo e/ou pós-positivistas”:
É bom que se diga, mais uma vez, que ninguém está autorizado a ler na Constituição o que lá não está escrito, prática muito gosto dos neo e/ou pós-positivistas, gente que reescreve a Constituição na toada de seus humores.O Min. Eros Grau defende que a única ética aplicável ao direito é a ética da legalidade, a ética do “direito posto”:
Permito-me afirmar, ademais, que o Poder Judiciário não está autorizado a substituir a ética da legalidade por qualquer outra. Não hão de ter faltado éticas e justiça à humanidade. Tantas éticas e tantas justiças quantas as religiões, os costumes, as culturas, em cada momento histórico, em cada recanto geográfico. Muitas éticas, muitas justiças. Nenhuma delas, porém, suficiente para resolver a contradição entre o universal e o particular, porque a idéia apenas muito dificilmente é conciliável com a realidade. A única tentativa viável, embora precária, de mediação entre ambas é encontrada na legalidade e no procedimento legal, ou seja, no direito posto pelo Estado, este com o qual operamos no cotidiano forense, chamando-o “direito moderno”, identificado à lei.
Estranhas e sinuosas vias são trilhadas nessa quase inconsciente procura de ius onde não há senão lex. Uma delas se expressa na produção multiplicada de textos sobre conflitos entre princípios e entre valores, o que em geral faz prova de ignorância a respeito da distinção entre o deontológico e o teleológico. Outra, na banalização dos “princípios” [entre aspas] da proporcional idade e da razoabilidade, em especial do primeiro, concebido como um “princípio” superior, aplicável a todo e qualquer caso concreto, o que conferiria ao Poder Judiciário a faculdade de "corrigir" o legislador, invadindo a competência deste.
Fui ironicamente acusado de ser, no exercício da magistratura, um positivista à outrance. Mas é que sei, muito bem, que a legalidade é o derradeiro instrumento de defesa das classes subalternas diante das opressões, em todas as suas múltiplas e variadas manifestações. Por isso --- permitam-me repeti-lo --- o Poder Judiciário não está autorizado a substituir a ética da legalidade por qualquer outra.
Quase concluindo, ocorre-me ainda, em homenagem a um dos cânones primordiais da ética judicial, o da neutral idade --- o juiz há de se manter estranho, não se engajando nos conflitos que estão incumbidos de solucionar ---,
8 comentários:
Concordo com a colocação, pois mostrou-se visível a fuga promovida pelo Supremo Tribunal destes princípios basilares do Positivismo Jurídico em casos como o da infidelidade partidária, em que comportou-se a corte à maneira oposta àquela pregada pelo ministro em seu recente voto.
Possivelmente, quanto ao episódio de ontem, não foi dado ao tema em questão o tempo suficiente para suscitar um verdadeiro debate nacional, nos moldes daquele promovido no caso das células-tronco, razão pela qual teria a corte seapresentado tímida no sentido de enverdedar por um caminho mais político. Preferiu, em sua ampla maioria(9 a 2), uma postura puramente jurídica.
Reforço que eu já postei. Na discussão da ADPF houve uma série de contradições nos votos expressos pela maioria na sessão de 06 de agosto de 2008. Esse é o caso flagrante do Ministro Eros Grau de um lado defende a força normativa dos fatos (caso do município Luis Magalhães) de outro defende a ética da legalidade como foi explicitado pelo Prof Alceu Maurício Jr.
O STF está se demonstrando uma corte instável. Procura o positivismo quando lhe é conveniente e decide de maneira exclusivamente principiólogica também quando lhe convém. A questão da inelegibilidade atinge diretamete os políticos e acho que por isso a cautela e a defesa do positivismo. No entanto eu concordo com a decisão. A presunção de inocência tem que prevalecer sempre. Só é condenado quando há sentença transitada em julgado. Acredito que a presunção de inocência seja indissociável do Estado Democrático de Direito.
A fundamentação positivista do Min. Eros Grau, muito bem notada pelo Professor Alceu Maurício, teve um precedente, não tão explícito como agora, na ADI do monopólio dos Correios, em que o magistrado defende a manutenção do monopólio pelo Estado brasileiro mediante interpretação do art. 21, X da CF. Cabe lembrar que em palestra proferida na PUC, cujo tema foi “Constituição e Realidade”, comentada neste blog por Guilherme Costa, o magistrado ressaltou que a interpretação autêntica, no sentido kelseniano, é que dá à Constituição o caráter de norma.
Com efeito, o STF parece demonstrar uma certa instabilidade no teor de suas decisões. Pouco tempo atrás, no debate sobre as células-tronco, o Tribunal deixou claro que nem mesmo o direito à vida pode ser considerado absoluto. Agora, parece manifestar posição contrária com relação à presunção de inocência. E qual seria a razão dessa instabilidade? Haveria alguma relação com o clima de que o STF é a última esperança de salvação da República que às vezes vemos se formar?
Professor Eduardo. Chamei atenção para o Prof Cattoni da UFMG pontuando a importância do voto do Ministro Eros Grau, que há sérias contradições com outros votos anteriores. Tal fato vc sublinhou muito bem na sua postagem. Dai que respondi ao Prof Cattoni - é o ERos flex ou gasolina. Está excelente o debate provocado pelos comentários do Prof Alceu Mauricio Jr.
Posso estar enganado, mas se eu bem me lembro do caso do amianto, não foi o próprio ministro Eros Grau que iniciou a contestação da inconstitucionalidade da tal lei estadual em nome da proteção ao direito à saúde (que estaria sendo atingido, se prevalecendo a lei federal)? Seria tambem uma mostra clara de uma postura para de superação da rigidez positivista.
Eduardo vc. está demonstrando mais uma contradição do Min. Eros Grau. Quanto ao julgamento de inconstitucionalidade de lei paulista vedando transito de amianto contrariando assim legislação federal, neste caso, o nosso Ministro apontou a necessidade de prevaler o direito à saude. E não o aspecto formal da norma constitucional de competência e de legislação federal.
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