Na reunião anual da Associação Brasileira de Ciência Política ocorrida na última semana do mês de julho de 2008, foi promovida uma mesa de debate sobre os vinte anos de vigência da Constituição Federal integrada por cientistas políticos. O jornal O Valor Econômico publica matéria em 04 de agosto de 2008 sob o título "Carta concentrou poder e impôs gasto social". Houve um balanço de que o nosso Texto Maior reforçou o papel do Poder Executivo criando um sistema político com corpo parlamentatirasta mas com uma dinâmica presidencialista. Mereceram, também, destaques as questões referentes as constantes mudanças constitucionais com base em emendas e o poder criativo exercido sem limites pelo Poder Judiciário. Reconheceu-se um saldo positivo é que o documento constitucional vigente privilegiou, ao contrário de constituições brasileiras passadas, a importância de políticas públicas sociais. A obra "20 anos de Constituição cidadã: efetivação ou impasse institucional"(Editora Forense), com a nossa organização, privilegia, também, essa abordagem interdisciplinar materializada nessa mesa redonda noticiada pelo jornal O Valor Econômico. No lançamento debate da citada obra no dia 28 de agosto de 2008, às 17 horas, na Casa Rui Barbosa, Rua São Clemente nº 134, Rio de Janeiro, procuraremos responder essa questão: houve efetivação ou impasse institucional? O debate conduzido pelos cientistas políticos no seu encontro anual realizado na Unicamp reforça que de uma parte, há um impasse institucional com essa presença forte do Poder Executivo federal, mas de outro aspecto, houve efetivação como é o caso retratado das políticas públicas. Leiam a matéria do jornal O Valor Econômico que inicia com a seguinte passagem de reflexão por parte do cientista político Fernando Limongi:
Limongi: "A oposição perdeu força e se quiser fazer mudanças mais consistentes terá de ascender ao poder"A Constituição Federal de 1988, que completa 20 anos em outubro, foi a principal responsável pela concentração de poderes no Executivo em detrimento ao Legislativo. A análise da Carta Magna por especialistas, duas décadas depois de sua promulgação, ajuda a entender o motivo pelo qual cerca de 85% das mudanças nas leis são de iniciativa do governo federal e não de parlamentares.
A redefinição dos poderes após o fim do regime militar no país teve "profundos reflexos" no atual sistema político, observa o cientista político Fernando Limongi, professor titular da USP especialista na relação entre os poderes Executivo e Legislativo. A aproximação dos partidos políticos e dos congressistas em relação ao governo federal, seja ele qual for, é um dos principais reflexos. "O plenário do Congresso é bastante disciplinado e 90% da base governista vota com o governo. O presidente sabe quantos votos terá em uma votação no Legislativo. Pode contar com esses 90% dos aliados", disse Limongi. "O Executivo tem muito controle sobre o Legislativo".
A Constituição, na análise do cientista político, ao centralizar os processos de decisão, criou condições ao governo ter consolidada sua base de sustentação e criou dificuldades para a oposição. "Se algum partido quiser mudar uma política pública terá de apoiar o governo. Se não for o Executivo a propor a mudança, ela não irá para frente. A oposição perdeu sua força e se quiser fazer mudanças mais consistentes terá de esperar sua ascensão ao poder", comentou.
Limongi participou na sexta-feira de uma mesa redonda sobre as duas décadas da Constituição, em Campinas, no encontro da Associação Brasileira de Ciência Política. Na discussão, apesar de elogios feitos à Carta Magna, os especialistas não deixaram de enumerar diversos pontos negativos, como a concentração de poderes no Executivo, a criação de um sistema político "com corpo parlamentarista e cabeça presidencialista", a grande abertura a mudanças e a possibilidade de alterações das leis por meio do Judiciário, sem passar pelo crivo do Congresso.
"O Judiciário muda a Constituição sempre que tem de opinar sobre um assunto controverso", disse o professor da Unicamp Sebastião Velasco e Cruz. "É uma Constituição sem fim. Desde 1988 já tem 62 emendas constitucionais. É uma taxa muito alta, quando comparada a legislações de outros países", observou Cláudio Couto, professor da PUC de São Paulo.
Couto destacou a relativa facilidade que os governos têm para alterar a Carta Magna. É necessária a aprovação de três quintos dos parlamentares, sem referendos ou plebiscitos. A própria estrutura da Constituição faz com que os governos tentem mudá-la, sempre que os interesses colidam com a Carta. Comparada com sete Constituições anteriores, é a que mais define sobre políticas públicas em seu texto, com determinações sobre áreas sociais. Nas outras, as normas constitucionais tinham mais espaço. "Parece fixar na agenda dos governos a modificação da constituição. Ela 'pede' para ser alterada. Se colidir com interesses dos governos, será alterada e não precisa de muito apoio do Congresso", disse.
As emendas constitucionais não devem ser analisadas como "uma forma de violar ou destruir a Constituição", afirmou Couto. "Ela está em processo de expansão. Essa abertura às mudanças são importantes. Não se pode analisar só como fruto de interesse de congressistas", disse.
A Constituição de 1988 não é emblemática só por ter encerrado o ciclo de poder militar, iniciado em 1964. A Constituição Cidadã, como é conhecida, mostra que os investimentos em políticas sociais não são marcas só dos governos mais recentes, de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), mas sim que fazem parte das diretrizes fixadas há 20 anos. "Até a Constituição de 1988 os recursos vinculados do Orçamento iam para infra-estrutura. Depois, passaram a ser destinados para educação, cultura e previdência", lembrou Limongi. Um exemplo são os recursos vinculados à educação. A União tem de garantir pelo menos 18% do Orçamento e os Estados, 25%. Na Previdência Social, houve um avanço representativo, com a criação da aposentadoria rural.
O balanço geral dos especialistas, apesar das críticas, é positivo. "Muitos mitos que cercam a Constituição, nesses vinte anos, têm de ser reavaliados", considerou Limongi. "Com todos os problemas, foi a Constituição que permitiu reformas políticas pós governo (de Fernando) Collor", comentou Velasco e Cruz.
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