segunda-feira, 6 de abril de 2009

A Comissão de Veneza e a integração na rede do STF

Folha de São Paulo de 06 de abril de 2009

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Adesão do Brasil à Comissão de Veneza

GIANNI BUQUICCHIO

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Um centro criado no âmbito da comissão visa a reunir e divulgar a jurisprudência constitucional dos países-membros e associados
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NA ÚLTIMA semana, o Brasil passou a ser o 56º país membro da Comissão Europeia para a Democracia através do Direito, mais conhecida como Comissão de Veneza.
A Comissão de Veneza é um órgão consultivo do Conselho da Europa sobre direito constitucional e trabalha principalmente em três áreas: assistência constitucional, justiça constitucional e questões relativas às eleições e referendos.
A comissão é composta por peritos independentes e reúne-se quatro vezes por ano em Veneza (Itália), em sessões plenárias para aprovar os seus pareceres e estudos e para promover a troca de informações sobre desenvolvimentos constitucionais.
A adesão do Brasil decorreu de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, órgão com o qual a comissão entrou em contato no quadro de cooperação com a Conferência Ibero-Americana de Justiça Constitucional, da qual o STF é membro fundador.
A justiça constitucional representa, de fato, uma das principais áreas de ação da Comissão de Veneza. Em seu âmbito foi criado o Centro de Justiça Constitucional, o qual visa a reunir e divulgar a jurisprudência constitucional dos países-membros e associados. A difusão da jurisprudência constitucional é feita por meio da publicação do Boletim de Jurisprudência Constitucional, que oferece aos leitores resumos das decisões mais importantes das mais de 80 cortes participantes.
A página eletrônica (www.codices.coe.int) contém base de dados com mais de 5.900 resumos de decisões judiciais e cerca de 7.500 documentos com a íntegra de seus textos, com Constituições de diferentes países e de informações sobre inúmeras cortes de todo o mundo e das leis que as regem.
Essa página permite também a criação de fórum on-line entre as cortes, a organização de conferências para e por elas e, finalmente, apoio às cortes quando sua independência estiver em risco.
O que a adesão do Brasil proporcionará à comissão e o que a comissão proporcionará ao Brasil?
A Comissão de Veneza foi criada em 1990 principalmente para ajudar o conjunto de novas democracias a abraçar, o mais rapidamente possível, os valores fundamentais sobre os quais o Conselho da Europa foi fundado e com os quais se comprometeu: uma verdadeira democracia, o Estado de Direito e a proteção dos direitos humanos.
Para esse efeito, a comissão forneceu aos Estados-partes um número considerável de aconselhamentos jurídicos, estudos e conferências. E, sem entrar no debate sobre a questão da universalidade, é claramente reconhecido que as questões jurídicas no cerne da democracia e da defesa dos direitos fundamentais ultrapassam as fronteiras continentais, razão pela qual a Comissão de Veneza se abriu também aos países não europeus.
A chegada do Brasil enriquecerá a comissão e o conteúdo de suas atividades com a experiência e a prática de uma verdadeira democracia, uma república federativa e presidencialista que soube desenvolver instituições fortes e consolidadas.
Além disso, se a área da justiça constitucional já se beneficiou com o capital da jurisprudência brasileira, a experiência do Brasil em questões de minorias, outra área de reflexão da comissão, aportará riqueza adicional para as soluções jurídicas que a Comissão de Veneza venha a propor aos seus Estados-membros.
Inegavelmente, esse patrimônio constitucional comum que a comissão sempre procura definir e construir será enriquecido com uma perspectiva extraeuropeia, tal como a do Brasil.
Pelo lado do Brasil, sua acessão como membro permitirá às instituições brasileiras recorrer à experiência da comissão e participar de pleno direito na elaboração de pareceres e estudos, assim como participar das sessões plenárias da Comissão de Veneza com direito de voto, contribuir para a organização e participar em conferências e intercâmbios de pontos de vista.
Enfim, o Brasil passará a ver a comissão como um parceiro independente, confiável e constante no campo da democracia e da proteção dos direitos humanos.
A Comissão de Veneza congratula-se com a expectativa de frutífera cooperação com o Brasil e com seu Supremo Tribunal Federal.



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GIANNI BUQUICCHIO, 64, professor do Instituto de Direito Internacional e Ciência Política da Universidade de Bari (Itália), é secretário-geral da Comissão de Veneza (Comissão Europeia para a Democracia através do Direito), órgão consultivo do Conselho da Europa sobre direito constitucional. Foi chefe da Divisão de Assuntos Jurídicos do Conselho da Europa (1990-1996).

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