Valor Economico
OPINIÃO JURÍDICA: O STF e a publicidade do 'plenário virtual'
Bruno Dantas
12/05/2009
É extremamente bem-vinda a decisão adotada pelo pleno do Supremo Tribunal Federal (STF) na sessão administrativa do dia 26 de novembro de 2008 de dar publicidade aos debates ocorridos no chamado, "plenário virtual", relativos à repercussão geral da questão constitucional discutida no recurso extraordinário (RE). Esses debates se referem à decisão da corte que antecede o julgamento do mérito do recurso e que diz respeito exclusivamente à existência ou inexistência de uma questão jurídica suficientemente importante e transcendental a justificar o exame da corte suprema.
O advento do jovem instituto jurídico da repercussão geral na reforma do Judiciário foi saudado pelo Supremo e pelos operadores do direito por representar filtro localizado no plano da admissibilidade dos recursos dirigidos à suprema corte que permitirá que o tribunal deixe de se manifestar em casos sem importância para a sociedade. Com esse filtro, a solução definitiva do caso chega mais rápida para quem tem razão no conflito.
A decisão do Supremo de publicizar em tempo real os debates travados no "plenário virtual" é bem-vinda porque devolve a corte à sua costumeira rota de respeito à Constituição. Desde maio de 2007, quando iniciou a aplicação do instituto da repercussão geral, vinha encontrando dificuldades para cumprir em sua exata medida o inciso IX do artigo 93 da Constituição, que estabelece que "todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade".
Não custa lembrar que como princípio constitucional, a publicidade representa direito fundamental que tem duas facetas: a primeira consistente no fato de que os atos judiciais precisam ser públicos, na medida em que as partes necessitam ter ciência do que está ocorrendo no processo e do que foi decidido, como decorrência do princípio do contraditório e da ampla defesa; e a segunda consistente no fato de que os atos judiciais precisam ser públicos como meio de controle social dos serviços da Justiça e de seus agentes.
Trata-se, portanto, de um instrumento de controle da eficácia da garantia da motivação das decisões judiciais, bem como de efetividade da participação popular no controle das decisões judiciais. É como decorrência desse princípio que as audiências se realizam a portas abertas, com acesso permitido ao público. Desse modo, a publicidade dos atos do Judiciário é, sobretudo, a confirmação dos princípios democráticos de direito, razão pela qual deve ser compreendida como finalizadora de uma ordem social.
Foi a Emenda nº21, de 2007, ao Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (RISTF) que trouxe a escolha da via eletrônica para a realização do debate acerca da repercussão geral das questões constitucionais constantes dos recurso extraordinário O artigo 323 e seguintes do RISTF introduzem procedimento para aferição da repercussão geral que lembra remotamente aquele aplicado pela Suprema Corte dos Estados Unidos ao "writ of certiorari".
De acordo com o regimento interno do Supremo, artigo 323, a análise preliminar caberá ao relator do recurso, que deverá submeter aos demais ministros, por via eletrônica, sua manifestação sobre a repercussão geral. Embora o emprego de recursos tecnológicos pelo Poder Judiciário seja louvável, merecendo menção iniciativas legislativas de vanguarda como a Lei nº 11.419, de 2006, e programas desenvolvidos no âmbito do próprio Judiciário, é necessário atentar para as formas modernas de violação dos princípios constitucionais, como parecia ser a deliberação por via eletrônica sem qualquer publicidade às partes.
No momento em que as inovações tecnológicas permitem que os ministros do Supremo decidam em sessões, por assim dizer, "virtuais", não se pode olvidar dos demais atores do processo que têm o direito de acompanhar a construção da decisão, e não apenas o seu resultado final. Com efeito, já tivemos oportunidade de afirmar (Repercussão Geral: perspectivas histórica, dogmática e de direito comparado - questões processuais. São Paulo: RT, 2008) que a questão deve ser resolvida à luz da ponderação de princípios, iluminada pelo princípio da proporcionalidade. De um ângulo, a promessa de razoável duração do processo e, de outro, a plenitude do contraditório.
Se, por um lado, há restrição ao direito de as partes utilizarem, na plenitude, a ampla defesa, por outro há o ganho de celeridade acarretado pela fuga da abarrotada pauta de julgamentos do Supremo. A questão, segundo nos parece, será bem equacionada se aplicada em estrita observância ao princípio da proporcionalidade.
Nesse terreno, segundo pensamos, a proporcionalidade estará atendida se aos atos processuais praticados for conferida ampla publicidade. Merece aplausos, portanto, ante o interesse institucional da sociedade nas matérias revestidas de repercussão geral, a recente decisão de se permitir à sociedade acompanhar, em tempo real, o voto de cada ministro no "plenário virtual", bem como a disposição contida no RISTF que fixa o dever de a presidência da corte criar e manter banco de dados eletrônico contendo tais informações.
Bruno Dantas é mestre e doutorando em direito pela PUC-SP e consultor-geral do Senado Federal
terça-feira, 12 de maio de 2009
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