Valor Economico 14 de maio de 2009
Sunstein: desconfiança total no julgamento humano, especialmente quando pessoas se unem por interesses comuns
"Going to Extremes: How Like Minds Unite and Divide" - Cass R. Sunstein. Oxford University Press. 199 págs.
Cass R. Sunstein é um respeitado "scholar", em direito, admiravelmente prolífico e influente. Os assuntos de suas centenas de artigos e mais de 15 livros vão da legislação constitucional aos direitos dos animais. "Se você olhar o que ele escreveu e fez, vai pensar que é alguém com 900 anos de idade", disse Scott H. Segal, sócio de Bracewell & Giuliani, uma empresa de advocacia e "lobbying". Na verdade, Sunstein, professor de direito na Universidade de Chicago por longo tempo (que foi para Harvard em 2008) é um afável senhor de 54 anos, dono de um formidável "drop shot" na quadra de tênis.
Mas a principal razão para se prestar atenção no que Sunstein diz é o posto que ele está prestes a assumir no governo de Barack Obama. Quando for confirmado como diretor do Escritíorio de Informação e Assuntos de Regulamentação, na jurisdição do Escritório de Gestão e Orçamento, Sunstein terá a seu cargo a avaliação das regulamentações que o governo deva fazer. Isso transforma seu novo livro, "Going to Extremes: How Like Minds Unite and Divide", que talvez não passasse de simples tese acadêmica de leitura estimulante (embora às vezes grandiloquente) em uma boa olhada na mente e na filosofia do novo czar da regulamentação nacional.
O que salta do livro é a desconfiança de Sunstein no julgamento humano acerca de tudo, da política aos negócios, especialmente quando as pessoas se reúnem em torno de interesses comuns. Pouco se verá de sabedoria em em multidões - nem muitos indivíduos bem informados. Em vários casos, "as pessoas sofrem de 'aleijão epistemológico', no sentido de que conhecem muito poucas coisas, e o que conhecem é errado", lamenta Sunstein.
Tudo fica pior quando as pessoas juntam suas cabeças. Gente que pensa igual tende a se agregar em grupos, e pode fazer com que suas opiniões se tornem ainda mais extremadas, afirma Sunstein. Vejam-se os mais raivosos seguidores de Rush Limbaugh. "Coisas muito ruins podem acontecer", adverte Sunstein. Essa "polarização grupal" ajuda a explicar o terrorismo islâmico, a falência da Enron, e mesmo os desvios éticos de governos, ele escreve. "Na Presidência de George W. Bush, muita coisa errada aconteceu por causa de uma cultura infeliz, que encorajava, em vez de combater, a polarização de grupos."
Não pense que você está imune ao pernicioso poder do grupo. Entre as evidências que Sunstein menciona (que incluem umas tantas de pesquisa própria) está o experimento realizado na Universidade de Stanford. Alguns estudantes, escolhidos ao acaso para serem "guardas", acabam brutalizando aqueles que são seus "prisioneiros". "Talvez todos nós, sob certas circunstâncias, possamos cometer atrocidades", conclui Sunstein. Certamente, ele diz, todos somos capazes de ser irracionais. Mesmo apelos diretos à razão podem ser pura perda de tempo. Naquilo que Sunstein chama de "uma descoberta especialmente perturbadora", falsas crenças podem na verdade ser fortalecidas quando se mostra às pessoas que estão agindo errado.
É uma visão bastante desalentadora, que ajuda a explicar por que ditadores frequentemente tomam decisões colossalmente ruins, por que histerias e loucuras se disseminam, por que mercados não funcionam tão bem na prática como na teoria e por que empresas tropeçam. Contudo, "Going to Extremes" também exibe o lado otimista de Sunstein. Uma razão é que as opiniões extremadas não são sempre más ou erradas. "Quando as pessoas estão buscando seus direitos, a polarização grupal pode ser altamente desejável", afirma Sunstein. "Foi o que ajudou o movimento abolicionista nos Estados Unidos. Também ajudou a derrubar o 'apartheid' e o comunismo."
Sunstein também acredita que cabeças obstinadas no erro podem ser mantidas sob controle. Parte da resposta está em colocar no poder pessoas com humildade, curiosidade e abertas. Outra parte está em fatos relacionados a custos e benefícios. Os "debates mais exacerbados sobre segurança ocupacional, direitos de deficientes, segurança nacional e ação afirmativa... poderiam tornar-se um pouco menos aquecidos com melhor compreensão das consequências de uma abordagem ou outra", afirma.
Então, como czar da regulamentação, Sunstein provavelmente adotará uma disciplinada abordagem fundada em análise de custo-benefício, em vez de deixar-se levar por uma aversão - ou entusiasmo - de fundo ideológico, pela regulamentação. Tome-se a mudança climática, "na qual tantas questões permanecem em aberto", ele escreve. Uma interpretação desapaixonada do que se sabe a respeito "sugere, por exemplo, que a inação global é indefensável e também que há limites para quão agressivamente devemos cortar emissões no futuro próximo".
No que se refere à sociedade em geral, Sunstein tem uma tocante fé na democracia e na diversidade. Em outras palavras, os Estados Unidos beneficiam-se tanto de seus Bill O´Reillys como dos Keith Olbermanns. "Extremismos enriquecerão o conjunto de argumentos e promoverão soluções sensatas", diz Sunstein.
Há um ar de elitismo no chamamento que Sunstein faz de especialistas esclarecidos (como ele próprio) que gentilmente corrigirão as massas em seus equívocos. "Paternalismo liberal" é o termo que ele já usou para sua filosofia de governo. Também há um fervente debate sobre se a abordagem de custo-benefício (a favorita de Sunstein) será capaz de avaliar tanto custos, que frequentemente caem quando novas regulamentações encorajam inovações, como os riscos de ameaças complexas. Mas, a menos que o insistente Sunstein ignore suas próprias prescrições em "Going to Extremes", o arranjo regulatório americano vai passar por uma renovação rigorosa.
quinta-feira, 14 de maio de 2009
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