quinta-feira, 28 de maio de 2009

A OAB e a globalização da advocacia

Valor Economico 28 de maio de 2009
OAB debate abertura do setor jurídico


Não há nada de concreto, mas somente o fato de a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) debater a possibilidade de que escritórios de advocacia estrangeiros possam contratar advogados brasileiros para atuar no direito local já traz uma mudança de paradigma. Segundo o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cezar Britto, essa atuação hoje seria inviável - mas não descarta que negociações do tipo possam avançar com o tempo. No início deste mês, Britto participou de um encontro com o "lord mayor" (prefeito) do distrito financeiro de Londres, Ian Lude, em um evento no Rio de Janeiro, e fechou um intercâmbio com relação a direitos humanos. Já sobre a contratação de advogados brasileiros para atuação em direito local por escritórios estrangeiros instalados no Brasil, na pauta das discussões, Britto afirma que há dois entraves: a falta de reciprocidade - já que as bancas brasileiras não podem contratar advogados ingleses para atuar no direito local inglês na Inglaterra - e a diferença cultural com relação à concepção da advocacia - pois a Inglaterra teria uma visão mais comercial do direito, enquanto haveria uma visão "mais social" da prestação de serviços jurídicos no Brasil. O presidente da Ordem, no entanto, não descarta que haja uma abertura ao longo dos anos.

A postura de Cezar Britto representa uma mudança com relação ao tema. Até então a Ordem e nenhum de seus representantes cogitava a possibilidade de uma futura flexibilização - até porque o Provimento nº 91 da entidade, de março de 2000, veda a atuação em direito local de escritórios estrangeiros instalados no país. Ou seja, mesmo que contratem advogados brasileiros, eles só poderão atuar em consultoria relacionada ao direito estrangeiro. Porém, a chegada no país de bancas americanas e britânicas de grande porte, movimento crescente a partir de 2006, evidencia um maior interesse pelo Brasil e uma pressão, ainda que velada, do setor para expandir suas formas de atuação no país. Até agora são nove escritórios estrangeiros instalados no eixo Rio-São Paulo - cinco deles chegados nos últimos três anos.

Apesar de afirmar que o gigante Mayer Brown, no Brasil desde 2007, não está esperando uma mudança nesse sentido, Stephen Hood, responsável pelo escritório em São Paulo, diz que isso refletiria uma tendência mundial. Segundo ele, todos os países da Europa, a maioria da Ásia e os Estados Unidos já permitem que um escritório estrangeiro possa contratar advogados locais que atuem na legislação local. "Os clientes gostam dessa ideia", diz. "E isso também pode ser bom para o advogado local que trabalha para um grande escritório estrangeiro, na medida em que ele também poderá participar dos lucros no mundo inteiro." O advogado Antonio Piccirillo, sócio da americana Proskauer Rose, no entanto, afirma que a banca está muito confortável com essa proibição. "Alguns escritórios estrangeiros têm uma visão mais ampla e querem ser advogados globais para atuar em todas as frentes, mas não é o nosso caso", diz. "A não ser que haja mesmo a abertura e que nossos concorrentes comecem com esse tipo de atuação."

A forma como as grandes bancas estrangeiras estão se instalando no Brasil já demonstra que há uma aposta de abertura no futuro, segundo o advogado Rogério Lessa, do escritório Demarest & Almeida Advogados. Ele acredita que, se realmente houver uma abertura, ocorrerá uma mudança substancial no mercado de serviços jurídicos - com a fusão de bancas estrangeiras e brasileiras ou entre escritórios locais para enfrentar a concorrência. Porém, o presidente da comissão de sociedades de advogados da OAB São Paulo, Horácio Bernardes Neto, do Xavier Bernardes Bragança Sociedade de Advogados, não acredita que essa negociação deva avançar com o tempo. "Temos que proteger nosso mercado", afirma. "Isso não seria benéfico para os escritórios brasileiros mesmo que houvesse a reciprocidade na atuação." Para ele, os escritórios estrangeiros são bem-vindos ao país para prestar consultoria sobre direito estrangeiro, limitação que deve continuar existindo.

Nenhum comentário: