sexta-feira, 21 de novembro de 2008

A pedagogia dos Direitos Fundamentais

Para compreendermos a dimensão do pensamento de Häberle postado abaixo segue a análise de Juliano Basile publicada no jornal "O Valor Econômico" de 21 de novembro de 2008.

Dantas e a 'pedagogia dos direitos fundamentais'

As idéias do alemão Peter Häberle ajudam a compreender duas tendências importantes do Supremo Tribunal Federal (STF): a visão de que os ministros devem ouvir pessoas comuns interessadas no resultado dos julgamentos e a noção de que a Constituição é dinâmica e deve ser interpretada no tempo.

Essas idéias foram aplicadas em julgamentos de grande repercussão nos últimos meses, como a autorização para pesquisas com células-tronco, o julgamento da reserva indígena Raposa Serra do Sol e a aplicação da lei de greve do setor privado para o funcionalismo.

Há, no entanto, uma terceira tendência hoje bastante intensa na Corte nos julgamentos envolvendo casos de corrupção e operações da Polícia Federal. Ao julgar esses processos, os ministros concluíram que devem atuar na proteção dos direitos fundamentais, mesmo quando percebem que as decisões serão condenadas pela opinião pública.

Foi dentro desse contexto que o STF concedeu habeas corpus para o banqueiro Daniel Dantas, preso durante a Operação Satiagraha, e o presidente da Corte, ministro Gilmar Mendes, fez críticas públicas à "espetacularização" das ações da PF. O que surge para a opinião pública como ações de combate à corrupção chega para o STF na forma de debates abrangendo diversos direitos fundamentais, como os de o acusado não ser algemado, não ser filmado preso, de não grampearem o seu telefone indiscriminadamente, de ele saber do que é acusado no momento em que está sendo preso.

O fato é que os acusados em operações da PF recorrem ao tribunal contestando os procedimentos utilizados nessas operações. Nesses processos, o STF tem atuado contra os apelos da opinião pública, que pede a prisão e a condenação de "poderosos", como banqueiros e políticos.

"O tribunal não teme os veredictos imediatos da opinião pública", afirmou Mendes, em 11 de agosto, no auge dos debates sobre a Satiagraha. "Pelo contrário. Se for necessário, ele arrasta a opinião pública com toda a tranqüilidade, porque sabe que a jurisdição constitucional, sobretudo, se faz com essa concepção anti ou contra-majoritária."

Dois dias depois, em 13 de agosto, o tribunal aprovou súmula vinculante para restringir o uso de algemas pela PF. Na ocasião, os ministros advertiram a PF que as prisões poderiam ser anuladas e os processos também, caso continuasse o que eles qualificaram como um "abuso" no uso de algemas. Em 6 de novembro, eles confirmaram as liminares que garantiram ao banqueiro Daniel Dantas, do Grupo Opportunity, o direito a responder em liberdade pelas acusações de formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e suborno na Satiagraha. Na ocasião, o relator do processo, ministro Eros Grau, apontou para o fato de haver ocasiões em que "é a própria sociedade que clama, de quando em quando, pela suspensão da ordem constitucional". "Esse é o drama que suportamos", admitiu.

Esse. movimento está sendo chamado pelos ministros de "pedagogia dos direitos fundamentais". Eles argumentam que o STF cumpre um papel diferente dos demais poderes: o de alertar para ilegalidades, mesmo quando todos pedem a punição de um suspeito. Dessa forma, os ministros reconhecem que há ocasiões em que o STF tem de ir na contramão para garantir determinados direitos. Quando há um clamor na sociedade por algemas, prisões, punições, os ministros podem optar por um caminho diferente e, sabendo que são minoria, ainda enfatizam que eles é que estão com a razão e ensinando todos nesse processo

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