sexta-feira, 18 de julho de 2008

O Presidente do STF e a sua autação política

O jornal O Valor Econômico na sua edição de 18 de julho de 2008 publica matéria importante (veja a postagem abaixo) a respeito do perfil de formulador de política por parte do Ministro Gilmar Ferreira Mendes, Presidente do STF. É importante artigo editado porque complementa o debate sobre o ativismo judicial. Assim, o Supremo Tribunal Federal vinha, principalmente, nesses dois últinos praticando um processo de ativismo judicial com o alargamento de suas competências. Tal fato acabou por entrar em conflito com a base do Poder Judiciário reconhecidamente vinculada ao um contexto de judicialização da política. É o caso exemplificativo das prisões decratas e os "habeas corpus" concedidos pela nossa Corte Maior no caso Daniel Dantas. E a reportagem do referido jornal traz mais elementos para compreender a crise institucional instalada no nosso Judiciário ao traçar um delineamento político do Ministro Gilmar Ferreira Mendes com "o seu novo direito". Destaca-se, na leitura abaixo, que o atual Presidente do STF afirmou que não faria uma "gestão revolucionária." Contudo, por exemplo, já dobrou no início de seu biênio presidencial o número de súmulas vinculantes.



Gilmar Mendes é bom formulador, mas falta-lhe tato
Juliano Basile18/07/2008



Wilson Dias/ABr
Gilmar Mendes, presidente do STF: dificuldade em justificar suas convicções
Considerado um dos mais importantes formuladores no campo do direito, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, não tem tanto êxito quanto o assunto é a estratégia de defesa de suas decisões. Essas são duas características do presidente do STF, que ficaram mais claras durante a Operação Satiagraha: ao mesmo tempo em que é um dos principais pensadores do direito, muitas vezes falta-lhe tato para defender suas convicções. Ao enfrentar duramente quem pensa de modo diferente, produz uma legião de adversários.

Mendes é visto como o pai de um novo direito. Foi ele quem articulou, ainda no governo FHC, a criação de ações que permitem o controle de assuntos nacionais no STF - a Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) e a Argüição por Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF). Ambas permitem o pulo de instâncias: podem ser propostas diretamente no STF que dá uma orientação geral para o país.

Ele é também o defensor da súmula vinculante e da racionalização da Justiça: freio aos processos repetitivos e realização de grandes julgamentos para que o STF decida de uma vez a questão para todo o país. Essas são inovações que mudaram a configuração do próprio Supremo. O tribunal tem, hoje, forte influência sobre as demais instâncias do país.

Por outro lado, é também conhecido pelas duras declarações contra adversários e por ser particularmente agressivo quando critica supostos abusos cometidos por delegados da Polícia Federal e procuradores de primeira instância. Ele mesmo foi alvo de ações dessa natureza quando era advogado-geral da União, de 2000 a 2002. Foi processado pelo procurador Luiz Francisco de Souza, célebre por constantes conflitos com o governo FHC. Sempre que pode condena abertamente o que chama de "ações ideológicas" da primeira instância. Foi assim que, líder na cúpula do Judiciário, adquiriu inimigos na base do Poder.

O presidente do STF defende que os detalhes de uma investigação não podem vazar para a mídia para evitar pré-julgamentos. A PF não só vazou filmes da Operação Satiagraha, como permitiu que vários trechos de transcrições telefônicas e troca de mensagens eletrônicas fossem parar nos meios de comunicação.

O alerta de que seu gabinete no STF estava sendo monitorado , feito por uma desembargadora de São Paulo uma semana antes da Operação Satiagraha, provocou revolta no presidente do Supremo. Isso fez com que ele advertisse a PF publicamente, falando na existência de um "estado policial", capaz de grampear qualquer pessoa, o que definiu como "coisa de gangsters".

Quando a operação foi deflagrada, em 8 de julho, Mendes mostrou-se calmo no primeiro momento. Essa é outra característica marcante: sabendo das críticas às suas convicções, ele adota uma postura serena no começo das entrevistas, mas, em seguida, não resiste e eleva o tom. Foi assim que pediu paciência aos jornalistas logo que foi questionado sobre o início da operação que prendeu Daniel Dantas, do banco Opportunity, e outras 23 pessoas. Num tom plácido, disse: "Vamos aguardar, pois eu não conheço os dados". Na seqüência, criticou a "espetacularização" das prisões, uso de algemas e a presença de câmeras de TV. Por fim, atacou duramente o pedido de prisão preventiva de uma jornalista que antecipou a investigação.

Após ser eleito pelos demais ministros para a Presidência do STF, em 12 de março, Gilmar Mendes negou grandes mudanças em sua gestão: "Não precisamos esperar nada de revolucionário". Bastou uma semana sob o seu comando para dobrar o número de súmulas vinculantes. De início, o salto foi de três para seis súmulas. Hoje, o STF já possui dez súmulas vinculantes, que obrigam a primeira instância a seguir o mesmo entendimento. Esse controle leva muitos procuradores e juízes de primeira instância a se queixarem do STF. É como se eles perdessem o poder, o controle sobre suas decisões.

Gilmar Mendes começou a estudar o controle do Supremo nos anos 80, quando os tribunais do país ainda não viviam a crise de excesso de processos iniciada com a Constituição de 1988. Vindo de Diamantino, no extremo oeste de Mato Grosso, e aprovado em concurso de oficial de chancelaria, iniciou o curso de mestrado em direito privado na Universidade de Münster, na Alemanha. O currículo da universidade obrigou-o a freqüentar aulas de direito penal e público. Interessou-se pelo último tema e particularmente pelo "controle de constitucionalidade" - ou o poder de o STF dizer o que vale para os demais tribunais do país.

Na semana passada, o ministro mostrou seu estilo ao país: soltou por duas vezes Daniel Dantas, causando perplexidade a dezenas de procuradores e juízes de primeira instância. Na quarta-feira, Mendes assistiu a uma homenagem e um protesto ao mesmo tempo. Enquanto recebia o presidente da Lituânia, 12 estudantes levantavam faixas e gritaram contra a soltura de Dantas.

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