domingo, 7 de junho de 2009

Escolha de ministros: um paralelo entre Brasil e EUA

As duas últimas colunas do jornalista político Merval pereira, no jornal "O Globo" foram interessantes no sentido de traçar um paralelo entre o processo de escolha dos juízes da corte maior tal qual realizado no Brasil e nos EUA.

-->fonte: http://arquivoetc.blogspot.com/2009/06/merval-pereira-o-supremo-e-politica.html

Sábado, Junho 06, 2009

Merval Pereira O Supremo e a política

l Os embates públicos entre o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, e o ministro Joaquim Barbosa, que ainda esta semana tiveram repercussões políticas, podem significar a introdução da ideologia nos trabalhos do Supremo, da mesma maneira que a escolha de um ministro da Suprema Corte dos Estados Unidos traz sempre consigo traços claros da tendência política do governo da vez, como na recente escolha de Sonia Sotomayor, descendente de hispânicos, pelo presidente Barack Obama

Um grupo de ativistas de um movimento denominado “Saia às Ruas” — criado depois que o ministro Joaquim Barbosa, em uma discussão com Gilmar Mendes no plenário do STF, afirmou que ele deveria ir às ruas para ouvir a opinião pública —, vaiou o presidente do STF que, momentos antes, havia dito em audiência numa comissão no Congresso que os juízes não podem julgar de acordo com os apelos da opinião pública.

Diego Werneck Arguelhes professor da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas, acha que “não existe mais inocência possível” nos EUA quanto à ligação entre indicações para a Suprema Corte e o projeto político do governo.

“Indicar um ministro para a Suprema Corte é percebido por todos os atores políticos e acadêmicos relevantes como uma forma alternativa de empurrar, mais ou menos gradualmente, o direito constitucional do país em um sentido desejado — ou preservar certos entendimentos constitucionais como estão, protegendo-os de possíveis mudanças”.

No Brasil, não é tão direta essa relação, a ponto de um presidente tido como de esquerda como Lula ter nomeado para o Supremo um conservador católico como o ministro Carlos Alberto Direito e um autoproclamado marxista como Eros Grau.

A tese de doutorado de Tatiana de Pino Albuquerque Maranhão, da Universidade de Brasília, que analisa as decisões e os votos dos ministros do STF em Ações Diretas de Inconstitucionalidade (Adins) entre 1988 e 2001, que tinham como um dos requeridos o presidente da República, demonstra que o Supremo manteve na imensa maioria dos casos as decisões das quais o Executivo participou, inclusive planos econômicos.

O jurista Joaquim Falcão, membro do Conselho Nacional de Justiça e diretor da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas, ressalta que, como a autora observa, a comparação com os Estados Unidos não é simples. Lá, em sistema bipartidário, é mais fácil tentar medir a correlação entre orientação políticopartidária do ministro, do presidente que o nomeou, e seus votos na Corte.

“De fato, no Brasil, com suas alianças políticas móveis e multipartidárias, o desafio é maior. Talvez o mais plausível seja procurar por alinhamento jurídico-político, e não simplesmente partidário, dos ministros do STF”, avalia Falcão.

O professor Diego Werneck Arguelhes não vê maiores significados na disputa entre Mendes e Barbosa além de dificuldades de relacionamento entre os dois, mas diz que há uma pressão da política sobre o Supremo, “que se torna simultaneamente mais demandado e mais poderoso a cada dia, e é igualmente certo que isso vai exercer uma pressão sobre a maneira como a instituição percebe sua identidade e se apresenta para a sociedade.

Quanto mais importante, maior a atenção e o interesse dos atores políticos no STF”.

Na verdade, no momento atual, diz ele, está particularmente difícil saber o que é conjuntura e o que é tendência.

Ele está começando a escrever um artigo sobre as transformações na presidência do STF, analisando as presidências de Gilmar Mendes e Nelson Jobim, “pontos fora da curva em termos do papel que geralmente se atribuía à presidência do STF”.

Tradicionalmente, segundo o professor Diego Arguelhes, a presidência do Supremo era relevante, com algum poder para definir a pauta do tribunal, mas não era uma posição a partir do qual o ocupante pudesse forçar suas visões sobre seus pares.

As presidências de Jobim e Mendes representaram estilos muito mais agressivos e dinâmicos de conceber o papel institucional dessa posição.

“A tendência do STF é de se tornar mais visível e mais importante, mas essa é necessariamente a tendência da presidência?”, pergunta Arguelhes.

Para ele, nesse momento, é difícil saber se estamos diante de uma tendência que vai deixar marcas institucionais mais profundas e levar a outros desdobramentos na mesma direção, ou se é simplesmente um momento excepcional, um “desvio” provocado por características/ projetos pessoais de Jobim e Mendes.

Também a tese de doutorado de Fabiana Luci de Oliveira, da Universidade Federal de São Carlos, sobre o Supremo e o controle da constitucionalidade das leis no Brasil de 1988 a 2003, demonstra a tendência de o STF concordar com as políticas do governo federal.

Segundo a autora, o Supremo tem declarado que “as políticas públicas e as ações do governo federal estão em conformidade com a Constituição”. Muitos ministros do STF têm levado em conta os limites concretos existentes para a realização dos direitos sociais fundamentais e de alguns preceitos constitucionais.

A impossibilidade de extensão e aplicação desses direitos, devido à ausência de capacidade estrutural do Estado para arcar com as consequências, tem sido levada em conta pelos ministros, ressalta Luci de Oliveira.

Por outro lado, a autora registra que “o relacionamento direto entre direito e política se intensificou depois da Constituição de 1988, que ampliou o espaço para a atuação política do Tribunal”.

Para legitimar sua atuação política, os ministros do STF se apoiam no profissionalismo, e por isso há grande consenso nas decisões do Supremo: mais de 80% das ações tiveram resultado unânime.

Com isso, produz-se a estabilidade, elemento essencial na promoção do cumprimento da “letra da lei”.

Domingo, Junho 07, 2009

MERVAL PEREIRA - Transparência total

O GLOBO

O processo de escolha da juíza Sonia Sotomayor, uma descendente de hispânicos, como a primeira indicação do presidente Barack Obama para o cargo de ministra da Suprema Corte dos Estados Unidos, anunciada no dia 26 de maio, começou em uma segunda-feira, 27 de abril, quando ela foi contatada por Gregory Craig, conselheiro da Casa Branca, que a sondou sobre a possibilidade de uma futura vaga na Suprema Corte. Entre aquela data e o momento do anúncio, um mês depois, ela teve frequentes conversas telefônicas com Cassandra Butts, viceconselheira da Casa Branca, incluindo telefonemas quase diários a partir do momento em que o juiz David Souter anunciou, a 1ode maio, sua intenção de renunciar ao cargo no final do corrente termo da Suprema Corte

Em 14 de maio ela foi entrevistada por Leslie Kiernan, um advogado do escritório Zuckerman Spaeder LLP. No sábado, 16, foi entrevistada por telefone por Gregory Craig, Cynthia Hogan, conselheira do vice-presidente, Ron Klain, chefe da equipe do vice-presidente, David Axelrod, conselheirosênior do presidente, Daniel Pfeiffer, vice-diretor de comunicações da Casa Branca e Cassandra Butts.

Na quinta-feira, dia 21, foi novamente entrevistada por membros da administração federal, incluindo Gregory Craig, Cassandra Butts, a conselheiraassociada do presidente Susan Davies, o chefe de gabinete da Presidência, Rahm Emanuel, David Axelrod, Ronald Klain e Cynthia Hogan.

Finalmente, teve uma entrevista pessoal com o presidente Barack Obama em 21 de maio e, no domingo, dia 24, conversou por telefone com o vice-presidente Joe Biden.

Ela teve também inúmeras conversas telefônicas com diferentes grupos formados pelas pessoas citadas acima. Outras pessoas participaram eventualmente nessas conversas, incluindo Trevor Morrison e Alison Nathan, conselheirosassociados do presidente, e Diana Beinart, conselheira de impostos.

Sotomayor recebeu bolsas de estudos durante os quatro anos na Universidade de Princeton e nos três anos na Universidade de Direito de Yale.

Foi graduada summa cum laude em Princeton, que a premiou como covencedora do Prêmio M. Taylor Senior Pyne por excelência acadêmica e serviços prestados à universidade.

Entre os muitos prêmios e honrarias que recebeu, o mais recente foi o de "Mujeres Destacadas", do jornal "La Prensa", em 17 de maio. No momento, tem US$ 31.985 na conta do banco, deve US$ 15.823 em cartões de crédito, tem uma conta no dentista estimada em US$ 15 mil, uma casa avaliada em US$ 1.017.500 e uma hipoteca de US$ 381.775.

Todas essas informações estão à disposição dos cidadãos do mundo através da legislação de acesso à informação dos Estados Unidos. Estão contidas em um documento de 173 páginas como resposta ao questionário do Comitê Judiciário do Senado, que é público.

A única informação que não está no questionário é sobre a investigação que o FBI faz rotineiramente sobre os indicados para a Suprema Corte.

O questionário do Senado dispensa a descrição dessas investigações Obama tem enfatizado basicamente três virtudes de sua candidata: primeiro, a experiência profissional (quase duas décadas como juíza, além de ter trabalhado anos como promotora pública). O perfil está de acordo, segundo o professor Diego Werneck Arguelhes, da Fundação Getúlio Vargas, com a tendência à "tribunalização"/" profissionalização" da Suprema Corte, que, pela primeira vez na história do país, é composta apenas por pessoas que tiveram experiência prévia em funções judiciais, ainda que por um curto período de tempo.

As credenciais de Sonia Sotomayor são "estelares", como se vê na descrição de sua passagem por Princeton e Yale e, sobretudo, em sua história de vida, vista como única, se comparada à elite jurídica dos EUA, e representativa, em relação a uma parte muito grande da população do país, filha de pais portorriquenhos e, portanto, "hispânica".

Diego Arguelhes ressalta que Obama não é o primeiro presidente a indicar um membro de uma minoria para uma posição judicial de destaque como a Suprema Corte, nem essa é uma prática necessariamente ligada ao Partido Democrata.

Na verdade, foi Ronald Reagan quem nomeou a primeira mulher (Sandra Day O'Connor), e foi George Bush quem nomeou um negro (Clarence Thomas) que hoje está na corte e é tido como o mais conservador de todos os ministros da Corte — votando sistematicamente contra qualquer medida de ação afirmativa orientada a negros, por exemplo.

Ele era um candidato perfeito para Bush: extremamente conservador, mas, sendo negro e de origem humilde, tinha um appeal muito grande junto a uma parcela substancial do eleitorado.

Para Arguelhes, Obama parece optar por uma estratégia parecida ao indicar Sotomayor: já disse que ela vai trazer para a Corte "a sabedoria acumulada em uma jornada de vida inspirada".

Sotomayor, por sua vez, enfatizou no seu primeiro pronunciamento após a indicação a sua experiência vivida como uma importante qualificação para ocupar o cargo.

Mas Sotomayor tem, no entender do professor Diego Arguelhes, duas características que Thomas não tinha: um perfil bipartidário (foi indicada a cargos judiciais tanto por Bush pai quanto por Bill Clinton) e o enfático apoio tanto de especialistas completamente "de esquerda", como a feminista Martha Minow, de Harvard, e completamente conservadores, como Stephen Carter, de Yale.

A única posição realmente forte e explícita que assumiu sobre o papel do juiz, segundo Arguelhes, foi acadêmica, e não judicial: ela já afirmou em palestras e nos artigos que publicou que o fato de ser mulher, de ser descendente de imigrantes e de ter passado por experiências de privação na infância afetou a sua visão do direito e o próprio resultado das decisões que precisa tomar como juíza.

Um comentário:

Prof. Ribas disse...

Prezado Guilherme Excelente sua contribuição a respeito da indicação e transparência a respeito da aprovação pelo Senado americano do nome da juíza Sonia Sotomayor para a Corte Suprema. Será que a futura vaga em 2010 a ser assegurada pela aposentadoria compulsória do Min. Eros Grau terá esse mesmo procedimento democrático adotado para Sonia Sotomayor: