sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Os impasses entre os poderes e o caso Battisti

Valor Economico de 11 de setembro de 2009
Caso Battisti pode criar crise entre poderes, diz Genro


O ministro da Justiça, Tarso Genro, criticou, ontem, o julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) que derrubou a concessão de refugiado político dada por ele ao italiano Cesare Battisti. Para Genro, Battisti é "um prisioneiro político" ilegal no Brasil. O ministro disse ainda que, se confirmada a votação parcial do STF de quatro votos a três pela extradição do italiano, a relação entre os poderes Executivo e Judiciário "estará em risco".

"Seja qual for a decisão, vai ser respeitada", assegurou Genro. "Mas é necessário dizer que abre um precedente extremamente grave na relação equilibrada entre os poderes da República", completou. "Será a mesma coisa de o Poder Judiciário julgar algo e depois o Executivo invadir a sua prerrogativa, por ser uma decisão errada. Estaria invadindo a competência do Poder Executivo", comparou.

Genro criticou ainda o voto do relator do processo, ministro Cezar Peluso, pela extradição de Battisti. "Acho que seu voto é equivocado e parte de juízo ideológico. Foi um voto tendencioso na medida em que ele deu tonalidades e pesos diferentes para os argumentos que usei no meu despacho."

Ao saber das críticas de Genro, o presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, convocou a imprensa para defender o voto de Peluso e a tendência que se configurou no STF a favor da extradição. "Peluso fez um voto com mais de 130 páginas esmiuçando todo o debate, entrando em todas as questões", disse Mendes, que considerou o voto do colega como "histórico". O presidente do STF lembrou que o caso não foi unânime no âmbito do Ministério da Justiça, onde o Comitê Nacional para os Refugiados (Conare) decidiu pela não concessão do status de refugiado a Battisti por três votos a dois. "A visão do ministro Tarso Genro não é sequer uma visão unitária do Ministério da Justiça."

Mendes ressaltou ainda que o Judiciário não entrou em um assunto de competência do Executivo. "No nosso sistema, cabe ao Judiciário dar a última palavra sobre a legitimidade dos atos administrativos, e é isso que o tribunal está fazendo em um processo de extradição", enfatizou. "Quantas vezes nós temos que conviver com a interferência do Executivo nas nossas questões?", questionou, citando projetos de lei do Judiciário que vão ao Congresso e não são aceitos pelo governo. "Nós ficamos incomodados, reclamamos, mas sabemos que é da regra do jogo democrático, institucional."

O ministro Marco Aurélio Mello, autor do pedido de vista que suspendeu o julgamento da extradição, afirmou, ontem, que pretende levar o seu voto para retomar o caso em duas semanas. Com isso, ele descartou que o novo ministro a ser indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a vaga aberta com a morte do ministro Carlos Alberto Menezes Direito decida a questão.

Para Marco Aurélio, esse novo ministro não deve chegar ao STF a tempo para votar o caso. Lula deverá fazer a indicação nos próximos dias. Após a indicação, o candidato à vaga de ministro do STF terá de passar por sabatina na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, votação no plenário, nomeação por Lula e, por fim, posse no tribunal.

Os mais cotados para a vaga são: o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Teori Zavascki, que conta com o apoio do ministro da Defesa, Nelson Jobim, e o advogado-geral da União, ministro José Antonio Dias Toffoli, que é próximo de Lula. Há ainda outros fortes concorrentes, como o presidente do STJ, ministro Cesar Asfor Rocha, o ministro Gilson Dipp, também do STJ e que conta com o apoio de delegados e de juízes federais, e os advogados Luís Roberto Barroso e Roberto Caldas.

A votação do pedido de extradição de Battisti foi suspensa quando o placar estava em quatro votos a três pelo envio do italiano para cumprir pena em seu país. Faltavam os votos de Marco Aurélio e de Gilmar Mendes. A expectativa é que a votação fique em cinco votos a quatro pela extradição, pois o primeiro foi favorável à concessão do status de refugiado político a Battisti e o segundo foi contrário. Se Lula indicar um ministro a tempo de votar o caso, esse último poderia empatar a questão.

Marco Aurélio justificou o seu pedido de vista alegando que precisa analisar questões polêmicas. Ele citou o prazo de prescrição (extinção) dos crimes atribuídos a Battisti e se o presidente Lula teria de cumprir a determinação do STF em caso de decisão final pela extradição. No Brasil, a prescrição é de 20 anos e na Itália é de 30 anos. Os quatro homicídios atribuídos a Battisti foram cometidos no fim dos anos 70, mas os julgamentos só foram concluídos em 1991 e 93. Segundo o relator, ministro Cezar Peluso, a pena se extinguiria em 2011 e 2013 no Brasil e em 2021 e 2023 na Itália. Peluso também concluiu que Lula deveria seguir a decisão do STF em caso de determinação de extradição.

Marco Aurélio afirmou ainda que tem pressa em concluir o seu voto porque o acusado encontra-se preso. "Quero devolver logo porque se trata de um processo com o envolvido preso."

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