domingo, 7 de dezembro de 2008

A metodologia sociológica no STF; "amicus curiae"

O mestrando da Puc-rio de Direito Daniel Giotti envia para ser postada a notícia publicada em "Consultor Jurídico" de 06 de dezembro de 2008 sobre a primeira dissertação de direito versando a respeito de pequisa quantitativa sobre o instituto do "amicus curiae" no STF. O IDP está sob a responsabilidade do Min. Gilmar Ferreira Mendes. A essa dissertação, haverá uma segunda sustentação sobre o ativismo judicial. Vale lembrar, ainda, que na citada primeira dissertação, teve a presença do Reitor da Unb José Geraldo de Souza Jr. Tais são relevantes porque cabe registrar o fato de no início dos anos 90 do século passado as primeiras dissertações da Unb eram sobre princípios (publicada Editora Brasilia Jurídica) de Alexy!. Hoje estamos discutindo temas sociológicos no STF. A dissertação citada do "amicus curiae" traz um importante tratamento quantitativo ao tema demonstrando que, na verdade, esse instituto funciona como um "lobby" no STF. Faltou, apesar de não termos a leitura da dissertação defendida, provavelmente, um cruzamento quantitativo em que temáticas o "amicus curiae" tem atuado na jurisdição constitucional. Por exemplo, os ministros do STF são bastante sensíveis a questões tributárias e ao peso das entidades envolvidas nessas discussões. Por consequência, não é suficiente um percurso quantitativo. As nossas análises sobre o STF em obras recentes oferecem mais uma perpectiva qualitativa em termos, a título de exemplo, de cortes analíticos para compreender os votos dos integrantes da Justiça Constitucional brasileira. O ideal é termos uma metodologia que articule o quantativo com o qualitativo. A dissertação acerta para o ponto de que o STF deve caminhar mais para o sistema americano do "disclosure" (audiências públicas). Mostramos em nossos trabalhos como Ativismo Jurisdicional e o STF (no prelo da Editora Juruá a sair em 2009) e na Revista Jurídica da Faculdade de Direito da UFRJ, número 3 que, em realidade, o STF não é tanto "portas abertas" como a dissertação indica a dissertação. Pelo contrário, as audiências públicas estão ocorrendo em temas morais (células-tronco) ou questões ambientais. Mas leiamos a notícia da citada revista eletrônica.




Amigo da parte


Amicus curiae influi em decisões do STF, mostra pesquisa

A expressão amicus curiae significa amigo da corte e serve para identificar
alguém que pede para entrar em um processo do qual não é parte, mas cujo
resultado pode influir em sua vida. Por isso, pede para ser ouvido. Nos
julgamentos de grande repercussão no Supremo Tribunal Federal, é cada dia
mais comum a permissão do uso desse instrumento como forma de dar voz à
sociedade nas decisões do mais alto tribunal do país.

Parte da literatura jurídica nacional descreve o amicus curiae (amici curiae
no plural) como um ator imparcial que entra no processo para oferecer ao
tribunal informações sobre questões complexas cuja análise ultrapassa a
esfera legal. Trata-se de uma visão romântica.

Na prática, de amigo da corte o amicus curiae não tem nada. Quem pede para
entrar em um processo como interessado na causa é extremamente partidário e
tem grande influência sobre as decisões tomadas nos casos em que atua. É um
advogado a mais em favor de uma das partes da disputa, com poder de
desequilibrar o jogo. Ou de reequilibrá-lo.

Essas são as principais conclusões da tese de mestrado da advogada Damares
Medina, que leva o titulo: Amigo da Corte ou Amigo da Parte? - Amicus Curiae
no Supremo Tribunal Federal. Em uma pesquisa minuciosa e inédita, a advogada
mostrou de forma empírica o que se observava na tribuna do STF - o amicus
curiae é ferramenta adicional de defesa das partes.

Em recentes julgamentos, como os da demarcação das terras indígenas da
Reserva Raposa Serra do Sol e da lei que permite pesquisas científicas com
células-tronco embrionárias, os mais apetitosos embates se deram entre os
amici curiae admitidos nas causas, com defesas acaloradas de suas posições,
sempre muito bem definidas em favor de uma ou outra parte.

"A maior parte dos estudos ainda se prende a uma visão normativa baseada em
modelos do que o amicus curiae deveria ser, mas não do que ele é", afirmou
Damares à revista Consultor Jurídico. O estudo aponta que a literatura
jurídica norte-americana, desde a década de 60, chama a atenção para o
perfil partidário do instrumento, a ponto de muitos o definirem como um
legítimo lobby judicial.

Influência em números

Para mostrar a influência e importância dessa ferramenta, que se populariza
a passos largos no Brasil, a advogada mergulhou na base de dados do Supremo
Tribunal Federal. Descobriu, por exemplo, que houve atuação de amicus curiae
em 119 das Ações Diretas de Inconstitucionalidade julgadas pela Corte, de
1992 até hoje.

Os dados revelaram que em apenas um dos 119 casos o "amigo da Corte" deu
informações sobre o tema em discussão ao tribunal sem pedir expressamente
que a ação fosse rejeitada ou acolhida. Outra observação importante do
estudo foi a de que a presença do amicus no processo aumenta razoavelmente
as chances de conhecimento da ação e a possibilidade de êxito da parte que
ele apóia.

Para chegar a essa conclusão a advogada fez alguns levantamentos distintos.
Em um deles, analisou 2.666 ações de controle concentrado de
constitucionalidade - Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), Argüição
de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) e Ação Declaratória de
Constitucionalidade (ADC). Neste caso, verificou que quando há a presença de
um "amigo" na ação, as chances de ela ser admitida pelo Supremo são 22%
maiores do que quando não há terceiro interessado na causa.

Em outro levantamento, Damares restringiu a análise às 119 ADIs com amicus
curiae já julgadas pela Corte. O resultado foi revelador. Nas ações julgadas
procedentes a proporção de casos com assistência de amicus é 18% maior do
que os casos sem assistência. Nos casos julgados improcedentes a vantagem do
amicus é de 15%.

"Os resultados dos julgamentos do STF no período pesquisado [de 1992 a 2008]
estabelecem uma robusta relação causal entre o ingresso do amicus curiae e o
aumento das chances de êxito do lado por ele apoiado", concluiu a advogada.

Ainda de acordo com a pesquisa, o Supremo tem uma política de portas abertas
à participação do amicus curiae nos processos. Foram identificados 469
processos nos quais houve pedido de ingresso de terceiros interessados na
causa. Dos 1.440 pedidos feitos nestes processos, o STF acolheu 1.235
(85,8%) e rejeitou 205 (14,2%).

O levantamento mostrou que 90% dos pedidos de entrada na ação são feitos por
pessoas jurídicas. As campeãs são as associações (40%) e entidades sindicais
(19%). Também em pouco mais de 90% dos casos o pedido de amicus curiae é
feito em ações de controle concentrado de constitucionalidade. A ação mais
querida dos amigos é a ADI, que concentra 84% dos pedidos de ingresso na
causa.

Amizade saudável

A advogada Damares Medina ressalta que o fato de o amicus curiae agir como
advogado de umas das partes da causa não deslegitima o seu uso. "Ele
continua como uma ferramenta legítima. Mas é importante ter a consciência
que de ele age em defesa de uma parte para evitar desvirtuamentos",
sustenta.

Para Damares, a idéia de que o amicus é um agente de democratização do
processo é equivocada: "O terceiro interessado na causa atua como um agente
que pluraliza o debate, sem qualquer dúvida. Mas isso não faz com que o jogo
seja necessariamente mais democrático ou equilibrado".

A pesquisadora alerta que a entrada de amicus curiae em defesa de apenas um
dos lados da causa pode desequilibrar a disputa, "aumentando a distribuição
assimétrica de informações entre todas as partes envolvidas no processo de
tomada de decisão".

Para evitar esse desequilíbrio, a advogada defende a adoção de mecanismos de
disclosure como as audiências públicas que, em importantes casos, começam a
ocupar espaço considerável na agenda do STF - só no segundo semestre de
2008, o Supremo convocou audiências públicas por duas vezes, para discutir
aborto de fetos anencéfalos (convocada pelo ministro Marco Aurélio) e
importação de pneus usados (convocada pela ministra Cármen Lúcia).

A tese de mestrado de Damares Medina discorre ainda sobre o amicus curiae no
Direito Comparado e sua história, mostra como a ferramenta é aplicada na
Suprema Corte nos Estados Unidos e traz o estudo do caso do tratamento da
questão do amianto no Brasil, caso no qual a atuação de "amigos da Corte"
provocou uma virada na jurisprudência do Supremo.

A defesa da dissertação da advogada foi feita na quarta-feira (3/12), depois
de dois anos de pesquisas sob a orientação do professor Paulo Gustavo Gonet
Branco, do Instituto Brasiliense de Direito Público. Damares Medina foi a
primeira aluna a concluir o mestrado em Direito Constitucional do programa
de pós-graduação do IDP.

O IDP, por sua parte, foi a primeira instituição de ensino superior a ter um
curso de pós-graduação reconhecido pelo Ministério da Educação sem ter o
curso regular de graduação.

A banca examinadora, formada pelos professores José Geraldo de Sousa Júnior,
reitor da Universidade de Brasília, Paulo Gustavo Gonet Branco e pelo
ministro Gilmar Mendes

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