Valor Economico 16 de março de 2010
Mercado financeiro: As apostas irracionais dos economistas
Paul Barrett, da Business Week
16/03/2010
"The Crisis of Capitalist Democracy" - Richard A. Posner
Adam Berry/Bloomberg
Posner, juiz federal e economista: credibilidade e olhar cético sobre Wall Street
Harvard, 408 págs., US$ 25,95
Meu momento favorito em meio ao até agora apático andamento dos trabalhos da Comissão de Investigação da Crise Financeira - com figuras escolhidas pelo Congresso para ir a fundo nas razões dessa calamidade - foi quando Jamie Dimon, CEO do JPMorgan Chase, citou sua filha para pôr os acontecimentos em perspectiva. "Minha filha me telefonou da escola, um dia desses, e disse: 'Pai, o que é uma crise financeira?'", relatou Dimon à comissão em 13 de janeiro. "E, sem tentar ser engraçado, eu disse: esse tipo de coisa acontece a cada cinco a sete anos. E ela respondeu: 'Por que todo mundo está tão surpreso?'"
Entendi o argumento de Dimon como uma sugestão de que deveríamos seguir o sensato exemplo de sua filha e simplesmente nos acalmar. Em 2015, no mais tardar, teremos outra experiência de Quase Depressão, e, que diabos, é assim mesmo que a coisa funciona. Certamente, a família Dimon não tem motivos para preocupar-se.
É esse tipo de despreocupação plutocrática associada a flácidas tentativas governamentais de reforma que levaram Richard A. Posner a, mais uma vez, soar o alarme. Em seu livro mais recente, "The Crisis of Capitalist Democracy" (A crise da democracia capitalista), o prolífico juiz federal e economista da Universidade de Chicago argumenta que forças competitivas inspiram os financistas a fazer apostas irracionais - particularmente quando apostam com dinheiro dos outros. Não podemos confiar que eles colocarão o bem coletivo à frente dos lucros, diz Posner. Por essa razão, o governo precisa intervir para limitar os riscos que os banqueiros assumem e, ocasionalmente, reparar os danos que infligem.
Posner, que menos de um ano atrás começou a dissecar a crise de 2008 com "A Failure of Capitalism" (Um fracasso do capitalismo, Harvard, maio de 2009), tem enorme credibilidade quando dirige um olhar cético a Wall Street. Como influente pensador do livre mercado, ele contribuiu para dar forma à ideologia antirregulamentadora que inspirou tantas políticas públicas desde 1980. Tardiamente, ele agora admite seu erro. A Escola de Chicago e todos os seus poderosos acólitos erraram, escreve Posner, "ao se convencer de que os mercados eram perfeitos, ou seja, autorreguladores, e que intervenção governamental neles quase sempre agrava as coisas".
Essa foi uma leitura grosseiramente errônea da história. Leis inspiradas pela Grande Depressão contribuíram para que se passasse meio século sem colapsos catastróficos. O desmantelamento dessa legislação e a castração das agências governamentais criadas para fazê-las serem cumpridas - desacompanhado da entrada em vigor de novas leis adequadas à Wall Street atual - explicam em larga medida termos estado, recentemente, à beira de uma catástrofe.
Posner deplora o inadvertido erro. Ele admite ter pessoalmente sucumbido à falácia da perfeição dos mercados, em alguns de seus textos sobre a solução para disputas legais por meio de análise econômica. Durante o governo Reagan, esses textos fizeram dele um candidato a ser nomeado para a Suprema Corte dos Estados Unidos. Uma das razões pelas quais ele não foi elevado a juiz foi que alguns membros do círculo de Reagan tinham ressalvas, por causa do incansável intelecto de Posner, temendo que ele pudesse ser imprevisível na Alta Corte. Esses receios foram premonitórios, como se vê; teria sido fascinante acompanhar a evolução de Posner como juiz.
Hoje, ele até tira o chapéu em respeito ao liberal Maynard Keynes, reconhecendo que diante da relutância de consumidores e empresas em gastar, em 2009, Washington teve de abrir as torneiras fiscais. Posner entoa dois hurras ao estímulo de emergência, julgando sua dimensão fruto de uma "estimativa razoável" em circunstâncias dramáticas, mas invectiva contra quaisquer outros estímulos como algo "irresponsável". Ele se preocupa com a capacidade governamental de enfrentar os efeitos posteriores: de aumento da dívida pública e a tentação de inflar a moeda.
Seu maior temor, porém, é que o sistema político não seja capaz de digerir as lições da crise. A sociedade tolera a irresponsabilidade inerente aos mercados financeiros, diz ele, ao promover crescimento e inovações. Embora o colapso tenha destacado a necessidade de regulamentação e fiscalização, os legisladores - mesmerizados pelas contribuições para suas campanhas com dinheiro dos banqueiros - parecem incapazes de aprovar senão reformas anódinas.
Posner apresenta sólidas sugestões para mudanças. Ele compartilha a posição daqueles que, como Paul Volcker, ex-presidente do Fed, restabeleceriam a lei Glass-Steagall, que impunha a separação da atividade bancária comercial dos negócios financeiros com recursos próprios e de outras formas de atividades financeiras de alto risco. Isso blindaria o financiamento de empresas de pequeno e médio porte das tempestades de Wall Street.
Ele também defende a eliminação do status semioficial das três grandes agências de classificação de crédito, mediante redução de seus conflitos de interesse e fortalecendo o assediado corpo de servidores públicos que constituem o quadro de pessoal das agências encarregas da regulamentação e fiscalização federal.
No geral, são todas boas ideias. Em suas páginas finais, porém, o autor não consegue reunir muita confiança em que os EUA vão superar seu cenário político estilhaçado, os "quase subornos" com dinheiro de campanha ou o mito suprapartidário de que podemos prosperar indefinidamente com baixa carga tributária e gastos públicos perdulários. Posner pode ter abalado velhas opiniões, mas, neste momento, ele não vê razões para acreditar que coragem ou pensamento renovado prevalecerão. (Tradução de Sergio Blum)
Paul Barrett é editor-assistente-administrativo da "BusinessWeek"
terça-feira, 16 de março de 2010
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário