quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Parecer da AGU não esclarece a natureza jurídica da permanencia de Battisti no Brasil

Itália apela ao STF para evitar soltura de Battisti
Juliano Basile | Valor
05/01/2011
BRASÍLIA - O governo da Itália recorreu, ontem, ao Supremo Tribunal Federal (STF) para evitar que o ativista político Cesare Battisti seja libertado da prisão.

Num documento de sete páginas dirigido ao presidente do STF, ministro Cezar Peluso, a Itália argumenta que o ato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de negar a extradição, no último dia de seu mandato, não está de acordo com o que foi decidido pelo STF.

"O plenário da Suprema Corte desconstituiu o refúgio e deferiu o pedido formulado pela República Italiana", diz o documento, referindo-se à autorização dada pelo STF, em dezembro de 2009, para a extradição de Battisti, que foi condenado em seu país por quatro homicídios, no fim dos anos 70, quando integrou organizações armadas de esquerda.

O ingresso do governo da Itália no STF é uma resposta ao pedido de soltura de Battisti, que foi feito anteontem, pelos seus advogados. Para os advogados do ativista, como Lula autorizou a permanência dele no país, falta apenas determinar a sua libertação da prisão, onde está desde março de 2007.

A extradição de Battisti era um processo arquivado no STF. Ontem, os autos foram reabertos e subiram ao gabinete de Peluso.

O presidente do STF foi o relator do processo e votou a favor da extradição, em novembro de 2009. O processo foi redistribuído, pois Peluso assumiu a Presidência da Corte, em abril de 2010, e, hoje, está sob a relatoria de Gilmar Mendes, que também votou pela extradição.

Apesar desses dois votos pró-envio de Battisti para a Itália, o caso deverá dividir o STF. Quando a extradição foi julgada, em novembro de 2009, foram cinco votos a quatro para autorizar o presidente a enviar Battisti para cumprir pena em seu país. Porém, um mês depois, a Corte se reuniu novamente e definiu que Lula poderia optar pelo não envio do italiano, dentro dos termos do tratado de extradição assinado entre o Brasil e a Itália. Pelo tratado, a extradição não é concedida caso haja fundado temor de perseguição política sobre o acusado.

Lula permitiu a permanência de Battisti no Brasil, ao assinar, no dia 31, um parecer da Advocacia-Geral da União (AGU), que reconheceu que o italiano poderia sofrer perseguição.

Agora, o que está em jogo é justamente a verificação da compatibilidade do ato de Lula com a decisão do STF. Os ministros terão de avaliar se o presidente agiu de acordo com os termos definidos por eles mesmos, numa votação dividida. Essa decisão deverá ser tomada a partir de fevereiro.

Mesmo em disputa perante o STF, advogados de Battisti e do governo da Itália têm um ponto em comum: ambos não sabem definir a condição do italiano.

"É um desafio dizer o que ele é", afirmou Nabor Bulhões, que foi contratado pela República da Itália para atuar no STF. "Ele não é refugiado, não recebeu asilo político. Ele é um imigrante ilegal por ter entrado no país com documento falso. Do ponto de vista jurídico, temos um refúgio disfarçado. Eu diria brincando que é um novo Manuel Zelaya", completou o advogado, referindo-se ao ex-presidente de Honduras, que se refugiou na embaixada brasileira naquele país, no ano passado.

Para a advogada Renata Saraiva, que defende Battisti na Suprema Corte, essa dúvida permanece, pois o presidente Lula não concedeu formalmente o refúgio ao italiano. Ele apenas permitiu a sua permanência no Brasil, negando a extradição. Segundo ela, esse é um caso diferente de todos os anteriores que envolveram um pedido de extradição.

(Juliano Basile | Valor

Um comentário:

Eunice disse...

Por mais que o conceito de soberania esteja atualmente relativizado, não é esse o caso para usar tal argumento. Se a decisão do STF for pela permanência de Battisti em nosso país estará permitindo que pessoas adentrem em nosso território ilegalmente, vivendo na cladestinidade, bem como desrespeitando a soberania de um Estado.