segunda-feira, 27 de maio de 2013

O perfil do STF pós AP 470

Valor Economico



27/05/2013 às 00h00
Barroso põe água na fervura do ativismo judicial




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Por Cristian Klein | De São Paulo

A indicação do advogado Luís Roberto Barroso para o Supremo Tribunal Federal (STF) revela como a presidente Dilma Rousseff escolheu a dedo o sucessor da vaga aberta pela aposentadoria do ex-ministro Carlos Ayres Britto. Dilma levou seis meses para tomar decisão, o que provocou uma das mais longas vacâncias na história recente do tribunal. O tempo só não é maior que os sete meses levados até a escolha de Luiz Fux, em março de 2011, neste caso, no entanto, porque o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva abriu mão da prerrogativa para que Dilma, empossada, e indicasse seu preferido.

A opção por Barroso chama atenção por pelo menos duas implicações, ambas face da mesma moeda das relações entre os três poderes da República. A primeira diz respeito ao ativismo judicial e a segunda tem a ver com a politização do Judiciário.

Quanto ao primeiro ponto, a entrada de Barroso representa água na fervura de um Supremo que nos últimos anos usurpa cada vez mais atribuições do Legislativo. O jurista é contra o ativismo judicial. Em entrevista ao Valor, em abril de 2009, Barroso comparava a atitude pró-ativa da Corte como um antibiótico. "É um remédio relevante, mas temporário". Na sexta-feira, um dia depois de sua indicação ao STF, o advogado reforçou sua posição, ao afirmar que decisões políticas devem ser tomadas por "quem tem voto". "Ninguém deve achar que o Judiciário vai ser o instrumento ideal de realização do governo das maiorias", disse, durante o 13º Congresso Brasileiro de Direito de Estado. Luís Barroso citou como exemplo de excesso a decisão de 2008 do Supremo sobre fidelidade partidária, que determinou que os mandatos pertencem às legendas e não aos políticos. Em sua opinião, a intervenção do Judiciário deve ocorrer somente quando Legislativo ou Executivo violarem "frontalmente" a Constituição e algum direito fundamental.

A preferência de Dilma por Barroso, por outro lado, sugere uma redução da voltagem política da escolha. É um contraponto ao processo de indicação de Fux, feito há dois anos e maculado por polêmica. No mês passado, o ex-ministro e ex-presidente do PT, José Dirceu, afirmou numa entrevista que Fux o havia procurado à época e prometera absolvê-lo no mensalão, caso ajudasse a ser indicado para o STF. O magistrado negou, mas o caso trouxe à tona os riscos da barganha e da politização no preenchimento das vagas do Supremo.

Para afastar o clima nebuloso, a escolha de Dilma recaiu sobre um dos mais renomados constitucionalistas do país. Apesar de ser cotado há anos para o STF e não esconder sua vontade de entrar para a Corte, Barroso chega sem a suspeita de ter percorrido gabinetes políticos em campanha escusa. A indicação ocorre num momento em que já havia reduzido o ritmo de divulgação de seu nome em meios de comunicação. De perfil garantista e ao mesmo tempo progressista, Barroso é um dos juristas mais citados por ministros do Supremo e ficou mais conhecido pela atuação em julgamentos e na defesa das pesquisas com células-tronco embrionárias, da união estável homoafetiva e do aborto de fetos anencéfalos.

Seu conhecimento de matéria constitucional deve lhe dar posição de proeminência entre os pares. Resta saber que tipo de alquimia se produzirá num Supremo tão politizado e suscetível a discórdias públicas, especialmente depois do julgamento do mensalão.
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