Plenário terá que decidir validade de seu regimento
Os embargos infringentes interpostos pela defesa de Delúbio Soares no Supremo Tribunal Federal (STF) anteciparam um debate espinhoso que já havia sido anunciado durante o julgamento do mensalão, mas que estava previsto para ocorrer em um momento posterior à análise dos embargos declaratórios dos 25 réus condenados pela Corte no ano passado. Contra a decisão dada na segunda-feira pelo ministro Joaquim Barbosa, relator da Ação Penal nº 470, que não admitiu o recurso do ex-tesoureiro do PT, o advogado Arnaldo Malheiros Filho entrará com um agravo, levando o plenário do STF a debater e decidir, pela primeira vez, se o artigo 333 de seu regimento interno continua válido.
O regimento interno do STF, de 1980, foi elaborado sob a vigência da Constituição antiga, numa época em que a Corte tinha a prerrogativa de estabelecer normas relativas às ações que julga como se fossem leis ordinárias. Com a Constituição de 1988, o STF perdeu esse poder. Desde então, passou a poder alterar seu regimento interno apenas em relação a questões que não se referem a procedimentos - que podem ser alteradas apenas por lei aprovada pelo Congresso Nacional. Foram 46 emendas regimentais desde 1988.
A Corte pode, no entanto, retirar previsões do regimento interno desde que entenda que essas normas foram revogadas por lei posterior. É é justamente isso que será julgado no agravo de Delúbio. O parágrafo único do artigo 333 do regimento interno do STF afirma que cabem embargos infringentes nos casos de julgamentos de ações penais originárias com pelo menos quatro votos divergentes - caso de 14 réus do mensalão, incluindo José Dirceu, José Genoino e Delúbio. No entanto, em 1990 entrou em vigor a Lei nº 8.038, que ditou regras para as diversas ações cujo julgamento é de competência dos tribunais superiores - entre elas, ações penais originárias.
A questão é técnica e dependerá de uma interpretação do plenário do STF sobre a forma de revogação de leis. Isso porque, embora a legislação de 1990 tenha se omitido em relação aos embargos infringentes previstos no regimento do tribunal, também não revogou expressamente essa previsão. Segundo juristas, há dois tipos de revogação de normas legais: a revogação expressa, que cita os dispositivos a serem excluídos do ordenamento jurídico nacional; e a revogação tácita, que costuma ocorrer pela frase "revogam-se as disposições em contrário" presente na última linha de diversas legislações.
No caso em questão, não houve revogação expressa, mas a previsão de embargos infringentes do regimento do STF também não é exatamente uma disposição em contrário do que diz a lei de 1990. Segundo o advogado Renato Stanziola Vieira, do Kehdi e Vieira Advogados, para que tivesse havido revogação a lei "teria que disciplinar a matéria de modo oposto". Isso, no entanto, não ocorreu: a própria Lei nº 8.038 faz remissão ao regimento dos tribunais em temas sobre as quais não prevê regras. Para Renato de Mello Jorge Silveira, professor titular de direito penal da Faculdade de Direito da USP, o próprio STF já decidiu, em diversas situações, que normas são revogadas por leis posteriores desde que essa revogação seja expressa.
O STF nunca se debruçou sobre o tema para discutir uma eventual revisão de seu regimento interno até o caso do mensalão, já que nunca houve um caso de quatro votos divergentes em ações penais originárias julgadas pela Corte. No entanto, os embargos infringentes previstos no artigo 333 já foram citados em outros julgamentos, tanto pelo ministro Celso de Mello - que já defendeu a validade do recurso no próprio acórdão do mensalão - quanto pelo próprio ministro Joaquim Barbosa.
Em 2007, o STF recebeu embargos de um réu de Roraima contra uma decisão condenatória do Tribunal de Justiça do Estado. Relator do caso, Joaquim Barbosa afirmou que "não cabem embargos infringentes no caso presente, tendo em vista que não houve divergência de quatro votos em qualquer questão decidida no acórdão embargado". Na sequência, cita o parágrafo único do artigo 333 do regimento interno do Supremo
O regimento interno do STF, de 1980, foi elaborado sob a vigência da Constituição antiga, numa época em que a Corte tinha a prerrogativa de estabelecer normas relativas às ações que julga como se fossem leis ordinárias. Com a Constituição de 1988, o STF perdeu esse poder. Desde então, passou a poder alterar seu regimento interno apenas em relação a questões que não se referem a procedimentos - que podem ser alteradas apenas por lei aprovada pelo Congresso Nacional. Foram 46 emendas regimentais desde 1988.
A Corte pode, no entanto, retirar previsões do regimento interno desde que entenda que essas normas foram revogadas por lei posterior. É é justamente isso que será julgado no agravo de Delúbio. O parágrafo único do artigo 333 do regimento interno do STF afirma que cabem embargos infringentes nos casos de julgamentos de ações penais originárias com pelo menos quatro votos divergentes - caso de 14 réus do mensalão, incluindo José Dirceu, José Genoino e Delúbio. No entanto, em 1990 entrou em vigor a Lei nº 8.038, que ditou regras para as diversas ações cujo julgamento é de competência dos tribunais superiores - entre elas, ações penais originárias.
A questão é técnica e dependerá de uma interpretação do plenário do STF sobre a forma de revogação de leis. Isso porque, embora a legislação de 1990 tenha se omitido em relação aos embargos infringentes previstos no regimento do tribunal, também não revogou expressamente essa previsão. Segundo juristas, há dois tipos de revogação de normas legais: a revogação expressa, que cita os dispositivos a serem excluídos do ordenamento jurídico nacional; e a revogação tácita, que costuma ocorrer pela frase "revogam-se as disposições em contrário" presente na última linha de diversas legislações.
No caso em questão, não houve revogação expressa, mas a previsão de embargos infringentes do regimento do STF também não é exatamente uma disposição em contrário do que diz a lei de 1990. Segundo o advogado Renato Stanziola Vieira, do Kehdi e Vieira Advogados, para que tivesse havido revogação a lei "teria que disciplinar a matéria de modo oposto". Isso, no entanto, não ocorreu: a própria Lei nº 8.038 faz remissão ao regimento dos tribunais em temas sobre as quais não prevê regras. Para Renato de Mello Jorge Silveira, professor titular de direito penal da Faculdade de Direito da USP, o próprio STF já decidiu, em diversas situações, que normas são revogadas por leis posteriores desde que essa revogação seja expressa.
O STF nunca se debruçou sobre o tema para discutir uma eventual revisão de seu regimento interno até o caso do mensalão, já que nunca houve um caso de quatro votos divergentes em ações penais originárias julgadas pela Corte. No entanto, os embargos infringentes previstos no artigo 333 já foram citados em outros julgamentos, tanto pelo ministro Celso de Mello - que já defendeu a validade do recurso no próprio acórdão do mensalão - quanto pelo próprio ministro Joaquim Barbosa.
Em 2007, o STF recebeu embargos de um réu de Roraima contra uma decisão condenatória do Tribunal de Justiça do Estado. Relator do caso, Joaquim Barbosa afirmou que "não cabem embargos infringentes no caso presente, tendo em vista que não houve divergência de quatro votos em qualquer questão decidida no acórdão embargado". Na sequência, cita o parágrafo único do artigo 333 do regimento interno do Supremo