terça-feira, 20 de janeiro de 2009

A política de quotas no Brasil e o Poder Judiciário

O jornal "Valor Economico" publica em 20 de janeiro de 2009 uma sintese da política de quotas e o poder judiciário no Brasil

A Justiça começa a se posicionar de forma mais contundente nos processos que questionam o sistema de cotas raciais nas universidades, pelo qual há um percentual de vagas reservadas nos vestibulares para estudantes afrodescendentes. A dificuldade para definir o que seria um ser humano negro e um branco, por conta da miscigenação de raças no Brasil, foi um dos argumentos centrais para que o Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região confirmasse uma sentença que autorizou um estudante a ingressar na Universidade Federal do Paraná (UFPR) - a comissão avaliadora do sistema na instituição havia reprovado o vestibulando, mesmo com a pontuação suficiente na prova, pois concluiu que ele não se enquadrava no perfil de um afrodescendente.

Desde 2003, quando foi adotado, o sistema de cotas é alvo de contestações na Justiça - os tribunais aguardam um posicionamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a questão, no julgamento de duas ações diretas de inconstitucionalidade (Adins) ajuizadas pela Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino (Confenem) e pelo partido Democratas (DEM). Os julgamentos foram suspensos no ano passado após um pedido de vista do ministro Joaquim Barbosa.


No Brasil não existe uma lei federal sobre as cotas, e cada uma das 47 universidades públicas que as adota possui um sistema diferente. Na UFPR, 20% das vagas são destinadas a alunos provenientes do ensino público, outras 20% para afrodescendentes, além de vagas extras para indígenas e portadores de deficiência - em 2008, ingressaram 550 alunos por meio das cotas raciais, cerca de 900 pela cota social e dez indígenas. Quando o sistema entrou em vigor na UFPR, em 2005, a universidade enfrentou quase 140 ações judiciais questionando as cotas. Nos anos seguintes, de acordo com Dora Bertúlio, procuradora federal da UFPR e presidente da comissão verificadora das cotas, as ações foram raras e questionam critérios de seleção, a exemplo desta última.


Ao avaliar o caso de um estudante que pleiteava o ingresso no curso de medicina pelo sistema de cotas raciais, impossibilitado porque a UFPR não o considerou de origem negra, a Justiça paranaense considerou que inexiste qualquer critério científico para tal aferição e que, sendo os critérios subjetivos, o sistema de cotas constitui uma verdadeira loteria para os candidatos. A Justiça declarou o direito do jovem à matrícula. De acordo com a sentença, o sistema é um meio de discriminação positiva e encontra resistências inclusive de pessoas negras - o juízo ressaltou que o Projeto de Lei nº 3.627, de 2004, é uma corrente positiva para privilegiar-se o lado social das cotas no país. Já para o desembargador Luiz Carlos de Castro Lugon, voto vencido no TRF, a matrícula não poderia ser concedida pois "moreno" não se confunde com "pardo" e não foi feito nenhum esforço pelo autor para evidenciar a linhagem africana, como uma perícia ou testemunha.


Segundo Dora Bertúlio, da UFPR, o critério para ingresso pelo sistema é perceber se a pessoa é passível de discriminação racial. Na opinião dela, até o advento do sistema nunca se discutiu quem era negro e, para ela, a dúvida tem sido usada como argumento racista contra o programa.

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