quarta-feira, 6 de abril de 2011

Virada na questão dos grampos telefônicos

Folha de S. Paulo 06 de abril de 2011

Decisão marca virada em uso de grampos

Para especialistas, invalidação de escutas pode levar à anulação de provas obtidas em outras investigações policiais

Escuta feita sem que tenha sido realizada apuração anterior fere direito constitucional, diz professora da USP

FLÁVIO FERREIRA
DE SÃO PAULO
FILIPE COUTINHO
DE BRASÍLIA

A decisão do Superior Tribunal de Justiça que anulou os grampos da Castelo de Areia é um marco para a corrente jurídica que prega a ilegalidade da adoção de interceptações telefônicas a partir de denúncias anônimas, segundo especialistas ouvidos pela Folha.
O Ministério Público agora vai examinar o texto do julgamento para avaliar quais provas do caso ainda poderão ser aproveitadas.
O subprocurador que representou a instituição no julgamento de ontem afirmou que é preciso avaliar os cuidados para evitar a anulação de provas em investigações criminais.
A professora de direito penal da USP Janaína Paschoal afirma que o julgamento de ontem não é inovador, "mas dá muita força para a tese de que o uso de interceptações telefônicas a partir de denúncias anônimas, sem o emprego de apurações preliminares, fere um direito fundamental previsto na Constituição Federal".
O criminalista Alberto Zacharias Toron, defensor do suíço Kurt Paul Pickel, acusado no processo de atuar como doleiro, afirmou que "a decisão do STJ manifesta a prevalência dos valores democráticos sobre a prepotência e a tirania daqueles que querem conduzir investigações à revelia da lei".
A procuradora Karen Kahn, responsável pela denúncia da Castelo de Areia, disse que é "difícil" saber quais provas vão se sustentar após a decisão do STJ.
"Como as buscas e apreensões, a princípio, decorreram de dados colhidos nas interceptações, fica difícil dizer que as provas vão se sustentar. Praticamente uma é decorrência da outra. Mas, para verificar essa possibilidade, é necessário analisar a decisão do STJ", afirmou.
Para a procuradora, "o que pode ser aproveitado são as provas produzidas antes das interceptações e o que não é derivado dos grampos".
Karen disse que, apesar da decisão do STJ, mantém a posição de que os grampos foram legais e não houve ilegalidades nas apurações.
De acordo com a procuradora, o julgamento não levou em conta uma delação premiada que antecedeu a Castelo de Areia e apontou indícios que justificaram as escutas telefônicas.
"Se tivesse que atuar novamente, faria exatamente a mesma coisa", disse.
O subprocurador-geral da República Moacir Mendes, que representou o Ministério Público Federal na sessão de julgamento de ontem, afirmou que "o caso serve para avaliar a necessidade de sempre se cercar de todos os cuidados na investigação de 1ª instância, para que um enorme trabalho de apuração não se perca".

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