Soltura imediata de Battisti: prisão sem objeto
Por Dalmo de Abreu Dallari
A legalidade da decisão do Presidente Lula, negando a extradição de Cesare Battisti
pretendida pelo governo italiano, é inatacável. O Presidente decidiu no exercício de
suas competências constitucionais, como agente da soberania brasileira e a
fundamentação de sua decisão tem por base disposições expressas do tratado de
extradição assinado por Brasil e Itália. É interessante e oportuno assinalar que as
reações violentas e grosseiras de membros do governo italiano, agredindo a dignidade
do povo brasileiro e fugindo ao mínimo respeito que deve existir nas relações entre
os Estados civilizados, comprovam o absoluto acerto da decisão do Presidente Lula.
Quanto à prisão de Battisti, que já dura quatro anos, é de fundamental importância
lembrar que se trata de uma espécie de prisão preventiva. Quando o governo da Itália
pediu a extradição de Battisti teve início um processo no Supremo Tribunal Federal,
para que a Suprema Corte verificasse o cabimento formal do pedido e, considerando
satisfeitas as formalidades legais, enviasse o caso ao Presidente da República. Para
impedir que o possível extraditando fugisse do País ou se ocultasse, obstando o
cumprimento de decisão do Presidente da República, concedendo a extradição, o
Presidente do Supremo Tribunal Federal determinou a prisão preventiva de Battisti,
com o único objetivo de garantir a execução de eventual decisão de extraditar. Não
houve qualquer outro fundamento para a prisão de Battisti, que se caracterizou,
claramente, como prisão preventiva.
O Presidente da República acaba de tomar a decisão final e definitiva, negando
atendimento ao pedido de extradição, tendo considerado as normas constitucionais e
legais do Brasil e o tratado de extradição firmado com a Itália. Numa decisão muito
bem fundamentada, o Chefe do Executivo deixa claro que teve em consideração os
pressupostos jurídicos que recomendam ou são impeditivos da extradição. Na avaliação
do pedido, o Presidente da República levou em conta todo o conjunto de
cirscunstâncias políticas e sociais que compõem o caso Battisti, inclusive os
antecedentes do caso e a situação política atual da Itália, tendo considerado, entre
outros elementos, os recentes pronunciamentos violentos e apaixonados de membros do
governo da Itália com referência a Cesare Battisti. E assim, com rigoroso fundamento
em disposições expressas do tratado de extradição celebrado por Brasil e Itália,
concluiu que estavam presentes alguns pressupostos que recomendavam a negação do
pedido de extradição. Decisão juridicamente perfeita.
Considere-se agora a prisão de Battisti. Ela foi determinada com o caráter de prisão
preventiva, devendo perdurar até que o Presidente da República desse a palavra
final, concedendo ou negando a extradição. E isso acaba de ocorrer, com a decisão de
negar atendimento ao pedido de extradição. Em consequência, a prisão preventiva de
Cesare Battisti perdeu o objeto, não havendo qualquer fundamento jurídico para que
ele continue preso. E manter alguém preso sem ter apoio em algum dispositivo
jurídico é abolutamente ilegal e caracteriza extrema violência contra a pessoa
humana, pois o preso está praticamente impossibilitado de exercer seus direitos
fundamentais. Assim, pois, em respeito à Constituição brasileira, que define o
Brasil como Estado Democrático de Direito, Cesare Battisti deve ser solto
imediatamente, sem qualquer concessão aos que tentam recorrer a artifícios jurídicos
formais para a imposição de sua vocação arbitrária. O direito e a justiça devem
prevalecer.
Dalmo de Abreu Dallari é jurista e professor emérito da USP
sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011
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