Neoconstitucionalismo na concepção de Zagrebelsky
1. Importância do direito comparado
Na contemporaneidade podemos torna-se notória uma propensão ultra-nacional, quiçá universal das funções nacionais da justiça constitucional. Apesar do Estado Constitucional não coincidir em toda a parte, no entanto, há muita convergência prática no julgamento em matéria constitucional entre os países.
Zagrebelsky ressalta que nos últimos tempos o intercâmbio de experiências tem obtido foco justamente no direito constitucional devido à citação e utilização, por parte das cortes, de doutrina e jurisprudência estrangeiras[1].
São dois os extremos desta discussão: por um lado temos o artigo 39 da Constituição da República da África do Sul de 1996, segundo o qual, ao interpretar o rol de direitos , os tribunais “devem levar em consideração o direito internacional e podem levar em consideração o direito estrangeiro”. Em contrapartida, temos a idéia de quem defende a manutenção das características originais da Constituição sob pena desta se tornar parte de um constitucionalismo genérico sem fronteiras e sem características.
O significado da contestação de um nascente “cosmopolitismo judicial” está bem representado por um projeto de lei apresentado em 2004 nos EUA, intitulado Constitution Restoration Act. Tal projeto inibe os juizes de interpretarem a Constituição levando em consideração documentos distintos dos nacionais incluindo as decisões de Cortes Constitucionais ou Supremas de outros Estados e os tribunais internacionais de Direitos Humanos. Tal medida é defendida para a suposta manutenção da identidade da constituição nacional.
Na Europa tal fato não ocorre, pois, a comparação é considerada o quinto método de interpretação constitucional depois dos quatro de Savigny (métodos gramatical, histórico, sistemático e teleológico).
A doutrina do direito natural alega que existem princípios que devem necessariamente informar o direito positivo e tais são universais, pois devem ser encontrados tanto no próprio ordenamento quanto nos demais ordenamentos. O consenso seria, portanto, uma forma de legitimação e fundamentação de cada uma das decisões judiciais.
Exemplo de aspiração da universalidade são as normas que tipificam a dignidade e igualdade de todos os seres humanos e os direitos fundamentais. Sua interpretação não é a interpretação de um contrato, de uma decisão administrativa, ou de uma lei, tal interpretação constitucional é um ato de adesão ou de ruptura a tradições histórico-culturais compreensivas da qual as Constituições particulares fazem parte.
A relevância para a jurisprudência nacional da jurisprudência estrangeira ou supra-nacional é que estas são um plano de fundo que agregam um significado preciso do momento histórico pelo qual as Constituições nacionais estão passando.
O direito interno deve ser sempre priorizado em detrimento do direito estrangeiro mas como afirma Zagrebelsky, é como se recorrêssemos a um “amigo com grande experiência” que nos faz pensar melhor, que amplia as perspectivas e enriquece as argumentações. Ou seja, “o direito comparado me serve como um espelho: me permite observar-me e compreender-me melhor”[2].
Não há o menor prejuízo da soberania nacional, pois os juízos de homogeneidade e de congruência dos textos e dos contextos continuam sendo das Cortes nacionais. Portanto, as Cortes têm raízes que as assentam em condições político-constitucionais nacionais, no entanto, têm a cabeça sempre direcionada para princípios de alcance universal. Se manter na clausura nacional significa de acordo com o autor “ficarem predispostas a políticas constitucionais e de direitos humanos voltadas apenas aos interesse nacionais”[3].
1. Importância do direito comparado
Na contemporaneidade podemos torna-se notória uma propensão ultra-nacional, quiçá universal das funções nacionais da justiça constitucional. Apesar do Estado Constitucional não coincidir em toda a parte, no entanto, há muita convergência prática no julgamento em matéria constitucional entre os países.
Zagrebelsky ressalta que nos últimos tempos o intercâmbio de experiências tem obtido foco justamente no direito constitucional devido à citação e utilização, por parte das cortes, de doutrina e jurisprudência estrangeiras[1].
São dois os extremos desta discussão: por um lado temos o artigo 39 da Constituição da República da África do Sul de 1996, segundo o qual, ao interpretar o rol de direitos , os tribunais “devem levar em consideração o direito internacional e podem levar em consideração o direito estrangeiro”. Em contrapartida, temos a idéia de quem defende a manutenção das características originais da Constituição sob pena desta se tornar parte de um constitucionalismo genérico sem fronteiras e sem características.
O significado da contestação de um nascente “cosmopolitismo judicial” está bem representado por um projeto de lei apresentado em 2004 nos EUA, intitulado Constitution Restoration Act. Tal projeto inibe os juizes de interpretarem a Constituição levando em consideração documentos distintos dos nacionais incluindo as decisões de Cortes Constitucionais ou Supremas de outros Estados e os tribunais internacionais de Direitos Humanos. Tal medida é defendida para a suposta manutenção da identidade da constituição nacional.
Na Europa tal fato não ocorre, pois, a comparação é considerada o quinto método de interpretação constitucional depois dos quatro de Savigny (métodos gramatical, histórico, sistemático e teleológico).
A doutrina do direito natural alega que existem princípios que devem necessariamente informar o direito positivo e tais são universais, pois devem ser encontrados tanto no próprio ordenamento quanto nos demais ordenamentos. O consenso seria, portanto, uma forma de legitimação e fundamentação de cada uma das decisões judiciais.
Exemplo de aspiração da universalidade são as normas que tipificam a dignidade e igualdade de todos os seres humanos e os direitos fundamentais. Sua interpretação não é a interpretação de um contrato, de uma decisão administrativa, ou de uma lei, tal interpretação constitucional é um ato de adesão ou de ruptura a tradições histórico-culturais compreensivas da qual as Constituições particulares fazem parte.
A relevância para a jurisprudência nacional da jurisprudência estrangeira ou supra-nacional é que estas são um plano de fundo que agregam um significado preciso do momento histórico pelo qual as Constituições nacionais estão passando.
O direito interno deve ser sempre priorizado em detrimento do direito estrangeiro mas como afirma Zagrebelsky, é como se recorrêssemos a um “amigo com grande experiência” que nos faz pensar melhor, que amplia as perspectivas e enriquece as argumentações. Ou seja, “o direito comparado me serve como um espelho: me permite observar-me e compreender-me melhor”[2].
Não há o menor prejuízo da soberania nacional, pois os juízos de homogeneidade e de congruência dos textos e dos contextos continuam sendo das Cortes nacionais. Portanto, as Cortes têm raízes que as assentam em condições político-constitucionais nacionais, no entanto, têm a cabeça sempre direcionada para princípios de alcance universal. Se manter na clausura nacional significa de acordo com o autor “ficarem predispostas a políticas constitucionais e de direitos humanos voltadas apenas aos interesse nacionais”[3].
2. Discricionariedade e Constituição viva
A comunicação entre jurisprudência pressupõe a existência, na interpretação, de uma margem de elasticidade, ou seja, de discricionariedade das cortes. A denominada constituição viva deve ser sensível as exigências constitucionais que mudam com o tempo.
A discricionariedade é um dado irrefutável. Zagrebelsky afirma que a melhor prova está nos projetos de reforma que tentam redefinir o papel das Cortes baseando-se na seguinte lógica: somos contra a discricionariedade, mas, como não a podemos eliminar, então ao menos que esta se oriente segundo as expectativas políticas, modificando com este objetivo os equilíbrios internos. Desse modo, se reforça o equívoco, golpeando a justiça constitucional em seu ponto essencial, a autonomia da política.
Tal alternativa não é uma questão entre constituição fixa e cristalizada e constituição viva e sim entre corte autônomas e cortes alinhadas com a política[4].
Uma característica não acidental da constituição é sua natureza principiológica, isto porque, os princípios são normas naturalmente abertas aos acontecimentos futuros. De acordo com Dworkin os princípios contêm conceitos (humanidade, dignidade, igualdade, liberdade e etc...) que vivem através de suas concepções mutantes com o tempo[5].
A Constituição, para o autor, não muda como uma lei qualquer nem prescreve em data determinada. Entre a geração constituinte e as gerações que a sucedem se institue uma relação como a que existe entre pais e seus filhos sucessores. Cada geração de herdeiros tenta melhorar e perpetuar a Constituição, e não deixar ao vento o legado recebido[6]. A lei da boa vida das constituições é seu desenrolar na continuidade. O instrumento normal para isto e a jurisprudência, o excepcional é a reforma.
De acordo com juiz Robert Jackson da U.S. Supreme Court no famoso caso do compulsory flag salute, West Virginia Board of Education versur Barnette, de 1943, a função da constituição é:
“O autêntico propósito de uma constituição é de subtrair certas matérias das vicissitudes das controvérsias políticas, colocá-las fora do alcance das maiorias e funcionários, sancioná-las como princípios legais aplicáveis por parte dos tribunais. O direito de cada um a vida, a liberdade, a propriedade, a liberdade de expressão, a liberdade de imprensa, a liberdade de culto e de reunião e os demais direitos fundamentais não podem ser submetidos ao voto; não dependem do êxito de alguma votação”[7].
A legislação é função sobre matéria que se vota enquanto que a justiça constitucional é função sobre matéria que não se vota, porque é res publica. A função da Corte Constitucional é inerente a forma republicana de Estado e não à democracia, daí tal distinção.
Portanto, nossos princípios constitucionais têm alcance universal e sua violação produz acima de tudo um julgamento moral em qualquer lugar da terra que aconteça. Para Zagrebelsky se não é uma forma institucional supranacional cosmopolita que está por vir ao menos existem contextos deliberativos comunicantes. A interação sempre levará a uma convergência de resultados.
Sendo assim, a abertura das jurisprudência a enlaces recíprocos não é uma moda nem uma pretensão de professores é uma exigência radicada na vocação contemporânea da justiça constitucional. É parte do processo de muitas facetas da “universalização do direito”, um fenômeno característico de nosso tempo jurídico[8].
A comunicação entre jurisprudência pressupõe a existência, na interpretação, de uma margem de elasticidade, ou seja, de discricionariedade das cortes. A denominada constituição viva deve ser sensível as exigências constitucionais que mudam com o tempo.
A discricionariedade é um dado irrefutável. Zagrebelsky afirma que a melhor prova está nos projetos de reforma que tentam redefinir o papel das Cortes baseando-se na seguinte lógica: somos contra a discricionariedade, mas, como não a podemos eliminar, então ao menos que esta se oriente segundo as expectativas políticas, modificando com este objetivo os equilíbrios internos. Desse modo, se reforça o equívoco, golpeando a justiça constitucional em seu ponto essencial, a autonomia da política.
Tal alternativa não é uma questão entre constituição fixa e cristalizada e constituição viva e sim entre corte autônomas e cortes alinhadas com a política[4].
Uma característica não acidental da constituição é sua natureza principiológica, isto porque, os princípios são normas naturalmente abertas aos acontecimentos futuros. De acordo com Dworkin os princípios contêm conceitos (humanidade, dignidade, igualdade, liberdade e etc...) que vivem através de suas concepções mutantes com o tempo[5].
A Constituição, para o autor, não muda como uma lei qualquer nem prescreve em data determinada. Entre a geração constituinte e as gerações que a sucedem se institue uma relação como a que existe entre pais e seus filhos sucessores. Cada geração de herdeiros tenta melhorar e perpetuar a Constituição, e não deixar ao vento o legado recebido[6]. A lei da boa vida das constituições é seu desenrolar na continuidade. O instrumento normal para isto e a jurisprudência, o excepcional é a reforma.
De acordo com juiz Robert Jackson da U.S. Supreme Court no famoso caso do compulsory flag salute, West Virginia Board of Education versur Barnette, de 1943, a função da constituição é:
“O autêntico propósito de uma constituição é de subtrair certas matérias das vicissitudes das controvérsias políticas, colocá-las fora do alcance das maiorias e funcionários, sancioná-las como princípios legais aplicáveis por parte dos tribunais. O direito de cada um a vida, a liberdade, a propriedade, a liberdade de expressão, a liberdade de imprensa, a liberdade de culto e de reunião e os demais direitos fundamentais não podem ser submetidos ao voto; não dependem do êxito de alguma votação”[7].
A legislação é função sobre matéria que se vota enquanto que a justiça constitucional é função sobre matéria que não se vota, porque é res publica. A função da Corte Constitucional é inerente a forma republicana de Estado e não à democracia, daí tal distinção.
Portanto, nossos princípios constitucionais têm alcance universal e sua violação produz acima de tudo um julgamento moral em qualquer lugar da terra que aconteça. Para Zagrebelsky se não é uma forma institucional supranacional cosmopolita que está por vir ao menos existem contextos deliberativos comunicantes. A interação sempre levará a uma convergência de resultados.
Sendo assim, a abertura das jurisprudência a enlaces recíprocos não é uma moda nem uma pretensão de professores é uma exigência radicada na vocação contemporânea da justiça constitucional. É parte do processo de muitas facetas da “universalização do direito”, um fenômeno característico de nosso tempo jurídico[8].
[1] Zagrebelsky, Gustavo. Jueces Constitucionales in Teoria del neoconstitucionalismo (Edición de Miguel Carbonell). Madrid: Editorial Trotta, 2007, p. 92.
[2] Op. Cit., p. 94-95.
[3] Op. Cit., p. 95.
[4] Op. Cit., p. 97.
[5] Op. Cit., p. 98.
[6] Op. Cit., p. 99.
[7] Op. Cit., p. 101.
[8] Op. Cit., p. 103.
Um comentário:
O post do Prof. Daniel destaca um ponto muito importante da interpretação constitucional: O uso do direito comparado. O direito comparado tem sido lagamente utilizado nas decisões do supremo tribunal, no entanto, no meu ponto de vista, o STF não vem definindo precisamente um critério ou metodologia no para uso do direito estrangeiro. O que tenho observado, na maioria das vezes, é a simples translação de conclusões jurisprudenciais alienígenas sem contextualização no sistema jurídico originário. Penso que uma metodologia de direito comparado deve ser acompanhada de uma metodologia histórica, analisando o contexto do direito estrangeiro, o contexto da norma interna que se pretende interpretar, e, por fim, a conexão e a relevância da jurisprudência estrangeira ao caso em julgamento. O que não podemos fazer é simplesmente dizer:"o tribunal alemão (americano etc.) fez assim, logo também devemos fazer do mesma forma.
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