segunda-feira, 16 de setembro de 2013

O garantismo de Celso de Mello

16/09/2013 Valor
Perfil garantista de Mello remonta a Collor
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Por Cristian Klein | De São Paulo
Divulgação / DivulgaçãoCelso de Mello, sobre Ficha Limpa: decisão recorrível não gera inelegibilidade
A tendência do ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), em aceitar os recursos que podem abrir um novo julgamento para 12 réus do mensalão, está ancorada num perfil garantista, que se reflete em suas decisões nos casos de maior repercussão analisados pela Corte.

Celso de Mello assumiu posições contramajoritárias e contrariou o que seria a expectativa da opinião pública sobretudo em temas penais que tinham maior impacto sobre as relações de poder e envolviam o destino de políticos.

O magistrado votou contra, em dezembro de 1994, a condenação do ex-presidente Fernando Collor de Mello, afastado do poder em 1992 por denúncias de corrupção; contra a revisão da Lei da Anistia, em abril de 2010; e também foi contrário à promulgação da Lei da Ficha Limpa e ao poder do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de investigar magistrados, ambos casos decididos em fevereiro no ano passado.

Nos dois primeiros julgamentos, o voto de Celso de Mello compôs a maioria de 5 a 3 e 7 a 2, respectivamente. Nos dois últimos, o ministro foi voto vencido, e os resultados na Corte foram de 7 a 4 e, no mais apertado de todos, 6 a 5.

É o placar que se repetirá na quarta-feira, quando o magistrado decidirá sobre os embargos infringentes. Estes recursos são previstos nos casos em que o réu obtém pelo menos quatro votos favoráveis à sua absolvição. Doze condenados entre os 25 réus do mensalão poderão ser beneficiados.

O tema dividiu a Corte ao meio pois o regimento do Supremo prevê os embargos infringentes, mas a Lei 8.038/90, que regula a tramitação de ações no STJ e no Superior Tribunal de Justiça (STJ), não diz nada a respeito. Se for coerente com declarações recentes e com sua própria trajetória no tribunal, Celso de Mello admitirá o recurso - apesar da pressão de parte da opinião pública.


"O ministro Celso é defensor ferrenho, talvez o maior, da figura do devido processo legal. Por diversas vezes, em casos grandes ou singelos, ele ficou conhecido por ser um defensor intransigente desta necessidade que se tem de observar direitos de natureza processuais, como o contraditório e a ampla defesa", afirma Saul Tourinho Leal, professor de direito constitucional da UniCeub, de Brasília.

Tourinho lembra que foi por meio de Celso de Mello que se abriu caminho para que as Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) obedecessem ao princípio do devido processo legal e garantissem, por exemplo, a abertura de prazo para contestações. "As CPIs estavam sendo tocadas por um experimentalismo e havia uma espécie de caça às bruxas", diz.

Para o professor, Mello é um dos expoentes da corrente de magistrados de perfil garantista, que têm visão mais humana do direito penal e são mais brandos em relação à imposição de penas.

Essa marca sempre esteve presente no mais antigo dos integrantes do Supremo, onde Celso de Mello chegou em 1989. Em 1994, o decano foi contra a condenação de Collor por corrupção passiva, ao argumentar que não havia um ato de ofício, ou seja, ação evidente que comprovasse o crime - jurisprudência que foi alterada pelo STF no mensalão.

No julgamento sobre a Lei da Ficha Limpa, Celso de Mello a considerou inconstitucional pois a inelegibilidade de candidatos sem o trânsito em julgado feriria a presunção de inocência.

Em casos de grande repercussão que envolveram debates morais, religiosos ou ligados a demandas de grupos da sociedade, Celso de Mello teve um comportamento liberal, ao votar a favor, por exemplo, do aborto de fetos anencéfalos, das cotas raciais nas universidades e da união homoafetiva - que, de resto, alcançaram ampla maioria na Corte.

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