Valor Economico 22 de novembro de 2012
Barbosa terá que definir casos que terão repercussão geral no Supremo
.Por Juliano Basile
De BrasíliaAo assumir, amanhã, a presidência do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Joaquim Barbosa, terá uma tarefa tão difícil quanto a de concluir o julgamento do mensalão: caberá a ele tomar a linha de frente para organizar os casos com repercussão geral e indicar quais devem ser julgados pela Corte.
Assim que a Corte colocar um ponto final na Ação Penal nº 470, Barbosa terá que definir junto com os demais ministros quais serão os próximos grandes temas que o tribunal vai analisar e a disputa pela pauta é intensa depois de um semestre no qual não se falou de outra coisa além do esquema de compra de votos no Congresso.
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Ao todo, o Supremo gastou 46 sessões com o mensalão e, com isso, deixou todos os demais processos em tramitação na Corte em segundo plano. Entre eles, estão teses fundamentais, como a correção das contas nos planos econômicos entre o fim dos anos 1980 e começo dos 1990, a cobrança de ICMS na base de cálculo da Cofins e a de imposto de Renda e de Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL) de empresas controladas e coligadas com outras no exterior.
Em relatório sobre a atual situação do STF, a equipe de Carlos Ayres Britto, o antecessor de Barbosa na presidência, alerta para a necessidade de imposição de 32 melhorias na gestão de processos na Corte. As tarefas são as mais distintas e vão desde a aprovação de mais uma sessão semanal no STF apenas para julgar os casos com repercussão geral até a integração dos gabinetes dos 11 ministros com o objetivo de identificar os casos mais relevantes para levá-los a julgamento.
Atualmente, há 613 casos com repercussão geral na Corte. São processos que, uma vez decididos, permitem que o resto do Judiciário siga a orientação que o Supremo deu. Ou seja, assim que o STF decide um caso com repercussão geral, o impacto é praticamente imediato, pois os demais tribunais do país sabem qual orientação devem seguir em causas semelhantes.
O processo do mensalão é relevante por causa do impacto político, do direcionamento que a Corte está dando para os crimes de corrupção, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e formação de quadrilha, além dos aspectos paradigmáticos, como o alto número de réus, as mais de 600 testemunhas e as mais de 50 mil páginas. Mas, formalmente, o julgamento desse caso não é suficiente para agilizar decisões sobre outros processos no Judiciário. O mensalão é uma ação só. Já os casos com repercussão geral são capazes de derrubar milhares de outros processos em tramitação nas quatro instâncias do Judiciário. Quando o STF define que um determinado tema tem repercussão geral, todos os processos sobre o assunto ficam à espera da decisão da Corte, parados nos demais tribunais do país.
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Apenas um tema com repercussão geral que começou a ser julgado durante a gestão de Ayres Britto na presidência - a atualização monetária do vale-refeição - tem impacto para mais de 26 mil ações. Isso significa que, se esse assunto foi decidido pelo Supremo, as instâncias inferiores vão poder concluir mais de 26 mil processos. A aprovação da política de cotas para negros nas universidades, que foi decidida neste ano, permitiu a conclusão de 158 processos.
Por causa do efeito praticamente imediato dessa sistemática de solução de processos que foi aprovada na reforma do Judiciário, em dezembro de 2004, Barbosa e Ricardo Lewandowski, que vai tomar posse como o vice-presidente do STF, amanhã, deixaram as discordâncias do mensalão de lado para concordar ao menos em uma coisa: é preciso priorizar os processos com repercussão geral. A dúvida na Corte é: como fazê-lo?
Alguns ministros já sugeriram, em reuniões internas do STF, a adoção de medida extrema: que seja vetado o direito a pedir vista num processo com repercussão geral. Mas há outras soluções para agilizar os julgamentos na Corte. Uma delas foi aprovada na gestão de Britto e já começou a ser utilizada no caso do mensalão: a apresentação do resumo dos votos oralmente, de maneira concisa com a juntada aos autos do processo do voto por escrito.
Outra solução está em curso: o STF está se aproximando dos demais tribunais para identificar as causas paradigmáticas e, com isso, definir uma agenda para os seus futuros julgamentos. Em 16 de maio, o Supremo recebeu representantes dos tribunais de Justiça de São Paulo, do Rio de Janeiro, do Distrito Federal e do Rio Grande do Sul para obter informações sobre as causas que mais entopem essas cortes. Quinze dias depois, o STF criou um Núcleo de Repercussão Geral para auxiliar no gerenciamento dessas causas. O objetivo final da Corte é o de organizar um sistema único de repercussão geral com todos os tribunais do país, o que permitiria julgar casos em escala para todo o Judiciário. Se ele for cumprido, a Corte terá mais motivos para comemorar do que quando concluir o mensalão - julgamento iniciado em 2 de agosto, sem data para terminar.
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quarta-feira, 21 de novembro de 2012
terça-feira, 20 de novembro de 2012
Texto de Rosenfeld
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sexta-feira, 16 de novembro de 2012
segunda-feira, 12 de novembro de 2012
STF e o mensalão
Valor Economico 12 de novembro de 2012
Jurisprudência do mensalão deixa bancos e empresas apreensivos
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O destino dos 25 condenados no caso do mensalão está longe de ser a única consequência do julgamento do processo pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Entre empresas, bancos e advogados que atuam para corporações o clima hoje é de apreensão. As profundas mudanças promovidas pela Corte em sua jurisprudência durante a análise da Ação Penal nº 470 produzirão impactos diretos no ambiente de negócios do país.
"Qualquer executivo, a partir do mensalão, vai estar muito mais preocupado em assinar qualquer liberação de recursos para evitar o que aconteceu no caso do Banco do Brasil e do Banco Rural ", afirma o gerente regional de compliance e segurança corporativa de uma multinacional presente em mais de 70 países, inclusive no Brasil.
O executivo, que preferiu não se identificar, refere-se à condenação de executivos que exerceram postos-chave no Banco Rural e no Banco do Brasil à época dos fatos em julgamento. No caso do Rural, três executivos do staff da instituição à época dos fatos foram condenados pelo Supremo - inclusive a própria dona do banco, Kátia Rabello, acusada de formação de quadrilha, gestão fraudulenta, evasão de divisas e lavagem de dinheiro por ter realizado empréstimos fictícios para o Partido dos Trabalhadores (PT) por intermédio das empresas do publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza, considerado o operador do mensalão. Já no caso do Banco do Brasil foi condenado, por corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro, o ex-diretor de marketing Henrique Pizzolato.
"O risco aumentou, e aumentou muito, porque agora qualquer administrador pode ser condenado por lavagem de dinheiro sem que tenha tido a intenção de cometer o crime", diz um outro executivo que atua em uma entidade de classe do setor empresarial.
O aumento do risco entre empresas e bancos ainda é uma sensação, já que o Supremo não concluiu o julgamento do mensalão - ainda precisa definir as penas dos condenados. Da mesma forma, a aplicação dos novos entendimentos da Corte pela Justiça de primeira e segunda instâncias do país e seu uso pelo Ministério Público em denúncias por crimes econômicos ocorrerá paulatinamente, até mesmo diante da morosidade característica do Judiciário brasileiro. Ainda assim, trata-se de uma impressão baseada no resultado decorrente de alguns dos mais complexos e combativos debates entre os ministros da Suprema Corte na história da República.
Entre as novidades geradas a partir do confronto de posições dos ministros do Supremo, uma das mais eloquentes e preocupantes, segundo as fontes ouvidas pelo Valor, é a chamada teoria do domínio do fato. Usada pela primeira vez pela Corte para basear uma condenação criminal, ela permite que se atribua responsabilidade penal a quem pertence a um grupo criminoso, mas não praticou diretamente o delito porque ocupava posição hierárquica de comando. Foi esse o argumento usado para condenar, por corrupção ativa e formação de quadrilha, o ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu, considerado o réu número um do mensalão.
O temor de advogados e empresários é o de que a teoria passe a motivar uma série de processos por crimes econômicos que coloquem, entre os réus, executivos e administradores de empresas pelo simples fato de que, em posição hierárquica superior, eles teriam, necessariamente, o domínio do fato - ou seja, saberiam de atividades ilícitas cometidas por seus subordinados. Esse receio foi externado durante o próprio julgamento pelo ministro revisor do processo, Ricardo Lewandowski. "Preocupa-me como os 14 mil juízes brasileiros vão aplicar essa teoria se essa Corte não der parâmetros para sua aplicação", disse. "Amanhã talvez o presidente da Petrobras possa ser responsabilizado por um vazamento de petróleo porque tem o domínio do fato."
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"A teoria do domínio do fato é um risco para o ambiente de negócios", diz o advogado Eduardo Salomão, sócio do escritório Levy & Salomão Advogados, banca que presta consultoria jurídica para empresas e tem, entre seus clientes, mais de 80 instituições financeiras nacionais e estrangeiras. Salomão cita o exemplo de um banco, cujos gerentes captam novos clientes que não poderiam aceitar por oferecerem risco à instituição, mas o fazem com a intenção de incrementar seus bônus. Se algum desses clientes utilizar o banco para lavar dinheiro proveniente de crimes, essa prática, se detectada pelas autoridades, pode se transformar em um processo criminal. "O executivo, como presidente do banco, poderia ser responsabilizado por ter o domínio do fato", diz. "Este é um fator de risco a mais para as empresas", afirma Salomão. Com a teoria, segundo ele, fica mais fácil ao órgão acusador "ir subindo de nível hierárquico" em termos de responsabilização. "É a metástase cancerosa da responsabilidade."
"No fundo a teoria é um grande facilitador da possibilidade de punição [de quem tem o dever de agir ou vigiar]", diz o professor de direito penal da Universidade de São Paulo (USP), Víctor Gabriel Rodriguez. Segundo ele, o caso do mensalão inaugurou o uso da teoria do domínio do fato pelo Supremo. "No caso dos crimes econômicos, daqui por diante algumas questões serão mais complicadas e de difícil defesa", acredita.
O domínio do fato é a principal inovação, mas não a única, decorrente do processo do mensalão. Dois importantes novos entendimentos nasceram do julgamento em relação ao crime de lavagem de dinheiro. O primeiro deles diz respeito ao tipo de conduta que pode ser punida por lavagem. A doutrina mundial estabelece que a lavagem de dinheiro existe quando ocorrem três situações específicas: a ocultação do dinheiro proveniente do crime, sua dissimulação (em geral no sistema financeiro) e sua inserção na economia.
No entanto, ao julgar o deputado federal João Paulo Cunha (PT-SP) e o ex-diretor de marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato, o Supremo interpretou a lavagem de dinheiro de outra forma. Os ministros entenderam, em sua maioria, que a simples ocultação do dinheiro da corrupção já caracteriza o crime, aumentando muito o escopo das situações que estariam sujeitas à punição. "O crime de lavagem pode se consumar já na primeira fase, a fase de ocultação", disse o ministro decano da Corte, Celso de Mello. Seu colega Luiz Fux foi ainda mais longe: "Quem compra um carro, uma joia, já pode incorrer em lavagem. O uso do dinheiro é, sim, lavagem de dinheiro."
O tema não é pacífico nem mesmo dentro do Supremo, a ponto de a decisão ter gerado protestos do ministro Marco Aurélio Mello - que votou pela absolvição de João Paulo Cunha e Pizzolato. "Preocupa-me sobremaneira o diapasão que se está dando ao tipo lavagem de dinheiro", disse o ministro durante as discussões. Boa parte dos votos proferidos pelo ministro em relação às imputações de lavagem de dinheiro foi pela absolvição dos réus - mas ele ficou vencido.
Marco Aurélio também ficou vencido em outra inovação criada pelo Supremo: a possibilidade de condenação de um acusado sobre o qual não se tem certeza de que estava ciente da origem ilícita do dinheiro recebido. Em termos jurídicos, o chamado dolo eventual - quando a pessoa assume o risco de receber um dinheiro cuja proveniência é obscura. "Assusta-me brandir que, no caso da lavagem de dinheiro, contenta-se o ordenamento jurídico com o dolo eventual", disse o ministro, um dos mais antigos da Corte.
De acordo com o advogado David Rechulski, do escritório que leva seu nome, o dolo eventual levará as empresas a implementarem políticas de maior cautela. "Mais cedo ou mais tarde, baseado nesse entendimento, o Ministério Público deverá atuar com mais intensidade nos casos de omissão penal relevante, em que haveria o dever legal de agir e a pessoa ficou inerte", afirma. "Principalmente em relação a gestores de fundos de investimento, o risco será grande", diz Rechulski.
O advogado Eduardo Salomão também prevê maior disposição dos juízes de instâncias inferiores em decretar prisões cautelares em casos de investigações por crimes econômicos. A correlação é de difícil comprovação, mas os recentes casos de investigação de fraudes em bancos de pequeno e médio porte, como o PanAmericano e o Cruzeiro do Sul, levaram à prisão provisória apenas o controlador e ex-presidente deste último, Luis Octavio Índio da Costa, solto neste fim de semana. No caso do PanAmericano, todos os ex-administradores respondem a processo penal em liberdade. Vale lembrar: a fraude no PanAmericano veio a público em 2010, antes, portanto, do início do julgamento do mensalão; já a do Cruzeiro do Sul foi tornada pública na era pós-mensalão.
Entre as empresas nacionais a impressão é de que o mercado ainda está em choque com o julgamento do mensalão, dizem advogados. Junta-se a ele a nova Lei de Lavagem de Dinheiro - a Lei nº 12.683, sancionada em 9 de julho deste ano -, que permitirá que qualquer tipo de infração penal seja passível de punição também por lavagem de dinheiro, e está pronto o novo cenário de risco.
Bruno Salles Ribeiro e Fábio Cascione, do escritório Cascione, Pulino, Boulos & Santos Advogados, acreditam que mesmo com as rígidas regras do Banco Central (BC), grandes bancos podem deparar-se com a situação de ver um crime tributário configurar também lavagem de dinheiro, resultando na responsabilização do executivo da instituição financeira. "Isso pode acontecer por terem contato com estruturações financeiras complexas, como middle marketing e private banking, em planejamentos tributários mais arrojados", afirma Ribeiro. "Certamente, as autoridades terão um radar maior em relação a essa possibilidade de interpretação para pressionar os contribuintes", diz.
Bruno Ribeiro interpreta que, de acordo com o julgamento do mensalão, mesmo que o executivo não saiba que determinado bem foi proveniente de uma infração penal, se assumir o risco de usá-lo, o compliance da empresa falhou e ele pode ser acusado de lavagem de dinheiro. "Por ser executivo da companhia, por meio de controles internos, ele deveria saber que usam dinheiro sujo na atividade da empresa", afirma.
De outro lado, o Supremo também entendeu, ao julgar o envolvimento dos executivos do Banco Rural no mensalão, que o descumprimento de regras de compliance previstas pelo regulador, no caso o BC, está sujeito à punição penal, e não apenas a sanções administrativas, como prevê a lei. Ou seja, o dever de agir em casos suspeitos, como prevê a lei, pode levar não só a uma punição na esfera administrativa mas também na esfera penal.
Isso por ter vários efeitos no setor privado. O principal deles é um aumento gigantesco na responsabilidade dos executivos - que podem ser condenados por crime de lavagem mesmo que não tenham cometido fraude ou gerido a empresa de forma temerária ou mesmo que não tenham a menor pista de que, pela instituição que comandam, circulou dinheiro sujo.
"O julgamento do mensalão, já nesse sentido, dá sinal de que, conforme essa lei for interpretada, a responsabilização será grave", diz Johan Albino Ribeiro, assessor jurídico do Bradesco. O diretor da área de compliance de outro grande banco, que preferiu não ser identificado, diz que o sistema financeiro já tem regras sedimentadas e com uma supervisão intensa dos órgãos de controle. "Mas é lógico que, com o julgamento o mensalão, os executivos ficarão mais atentos e talvez mais apreensivos", afirma.
Com isso, na prática, as operações do dia a dia dos bancos e das empresas deverão passar a submeter-se a um controle ainda mais rigoroso, com treinamento de funcionários, reforçando os conceitos de compliance, segundo Johan Albino Ribeiro. "Essa é a ação possível: encontrar os pontos de maior atenção para insistir nos cuidados. Nas relações com fornecedores, por exemplo, conhecer ainda melhor a empresa, saber mais sobre de quem ela recebe e para quem ela paga", afirma.
Em razão desse cenário, a demanda das empresas nos escritórios de advocacia já é de revisão das regras internas para tentar melhorar a efetividade do compliance, segundo Bruno Ribeiro. "Isso será importante inclusive em eventuais processos judiciais porque, muitas vezes, a defesa da empresa acusada de lavagem será a demonstração de um compliance que comprove que todas as cautelas possíveis para evitar o risco foram tomadas", afirma Fábio Cascione.
A evolução na jurisprudência do Supremo em relação à lavagem ainda aguarda confirmação - o que deve ocorrer apenas após a publicação do acórdão (a decisão condenatória com os votos de todos os ministros). Mas o intenso debate entre os ministros quando da votação dos crimes de lavagem do mensalão mostra que, no mínimo, a semente da mudança está plantada.
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Jurisprudência do mensalão deixa bancos e empresas apreensivos
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O destino dos 25 condenados no caso do mensalão está longe de ser a única consequência do julgamento do processo pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Entre empresas, bancos e advogados que atuam para corporações o clima hoje é de apreensão. As profundas mudanças promovidas pela Corte em sua jurisprudência durante a análise da Ação Penal nº 470 produzirão impactos diretos no ambiente de negócios do país.
"Qualquer executivo, a partir do mensalão, vai estar muito mais preocupado em assinar qualquer liberação de recursos para evitar o que aconteceu no caso do Banco do Brasil e do Banco Rural ", afirma o gerente regional de compliance e segurança corporativa de uma multinacional presente em mais de 70 países, inclusive no Brasil.
O executivo, que preferiu não se identificar, refere-se à condenação de executivos que exerceram postos-chave no Banco Rural e no Banco do Brasil à época dos fatos em julgamento. No caso do Rural, três executivos do staff da instituição à época dos fatos foram condenados pelo Supremo - inclusive a própria dona do banco, Kátia Rabello, acusada de formação de quadrilha, gestão fraudulenta, evasão de divisas e lavagem de dinheiro por ter realizado empréstimos fictícios para o Partido dos Trabalhadores (PT) por intermédio das empresas do publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza, considerado o operador do mensalão. Já no caso do Banco do Brasil foi condenado, por corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro, o ex-diretor de marketing Henrique Pizzolato.
"O risco aumentou, e aumentou muito, porque agora qualquer administrador pode ser condenado por lavagem de dinheiro sem que tenha tido a intenção de cometer o crime", diz um outro executivo que atua em uma entidade de classe do setor empresarial.
O aumento do risco entre empresas e bancos ainda é uma sensação, já que o Supremo não concluiu o julgamento do mensalão - ainda precisa definir as penas dos condenados. Da mesma forma, a aplicação dos novos entendimentos da Corte pela Justiça de primeira e segunda instâncias do país e seu uso pelo Ministério Público em denúncias por crimes econômicos ocorrerá paulatinamente, até mesmo diante da morosidade característica do Judiciário brasileiro. Ainda assim, trata-se de uma impressão baseada no resultado decorrente de alguns dos mais complexos e combativos debates entre os ministros da Suprema Corte na história da República.
Entre as novidades geradas a partir do confronto de posições dos ministros do Supremo, uma das mais eloquentes e preocupantes, segundo as fontes ouvidas pelo Valor, é a chamada teoria do domínio do fato. Usada pela primeira vez pela Corte para basear uma condenação criminal, ela permite que se atribua responsabilidade penal a quem pertence a um grupo criminoso, mas não praticou diretamente o delito porque ocupava posição hierárquica de comando. Foi esse o argumento usado para condenar, por corrupção ativa e formação de quadrilha, o ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu, considerado o réu número um do mensalão.
O temor de advogados e empresários é o de que a teoria passe a motivar uma série de processos por crimes econômicos que coloquem, entre os réus, executivos e administradores de empresas pelo simples fato de que, em posição hierárquica superior, eles teriam, necessariamente, o domínio do fato - ou seja, saberiam de atividades ilícitas cometidas por seus subordinados. Esse receio foi externado durante o próprio julgamento pelo ministro revisor do processo, Ricardo Lewandowski. "Preocupa-me como os 14 mil juízes brasileiros vão aplicar essa teoria se essa Corte não der parâmetros para sua aplicação", disse. "Amanhã talvez o presidente da Petrobras possa ser responsabilizado por um vazamento de petróleo porque tem o domínio do fato."
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"A teoria do domínio do fato é um risco para o ambiente de negócios", diz o advogado Eduardo Salomão, sócio do escritório Levy & Salomão Advogados, banca que presta consultoria jurídica para empresas e tem, entre seus clientes, mais de 80 instituições financeiras nacionais e estrangeiras. Salomão cita o exemplo de um banco, cujos gerentes captam novos clientes que não poderiam aceitar por oferecerem risco à instituição, mas o fazem com a intenção de incrementar seus bônus. Se algum desses clientes utilizar o banco para lavar dinheiro proveniente de crimes, essa prática, se detectada pelas autoridades, pode se transformar em um processo criminal. "O executivo, como presidente do banco, poderia ser responsabilizado por ter o domínio do fato", diz. "Este é um fator de risco a mais para as empresas", afirma Salomão. Com a teoria, segundo ele, fica mais fácil ao órgão acusador "ir subindo de nível hierárquico" em termos de responsabilização. "É a metástase cancerosa da responsabilidade."
"No fundo a teoria é um grande facilitador da possibilidade de punição [de quem tem o dever de agir ou vigiar]", diz o professor de direito penal da Universidade de São Paulo (USP), Víctor Gabriel Rodriguez. Segundo ele, o caso do mensalão inaugurou o uso da teoria do domínio do fato pelo Supremo. "No caso dos crimes econômicos, daqui por diante algumas questões serão mais complicadas e de difícil defesa", acredita.
O domínio do fato é a principal inovação, mas não a única, decorrente do processo do mensalão. Dois importantes novos entendimentos nasceram do julgamento em relação ao crime de lavagem de dinheiro. O primeiro deles diz respeito ao tipo de conduta que pode ser punida por lavagem. A doutrina mundial estabelece que a lavagem de dinheiro existe quando ocorrem três situações específicas: a ocultação do dinheiro proveniente do crime, sua dissimulação (em geral no sistema financeiro) e sua inserção na economia.
No entanto, ao julgar o deputado federal João Paulo Cunha (PT-SP) e o ex-diretor de marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato, o Supremo interpretou a lavagem de dinheiro de outra forma. Os ministros entenderam, em sua maioria, que a simples ocultação do dinheiro da corrupção já caracteriza o crime, aumentando muito o escopo das situações que estariam sujeitas à punição. "O crime de lavagem pode se consumar já na primeira fase, a fase de ocultação", disse o ministro decano da Corte, Celso de Mello. Seu colega Luiz Fux foi ainda mais longe: "Quem compra um carro, uma joia, já pode incorrer em lavagem. O uso do dinheiro é, sim, lavagem de dinheiro."
O tema não é pacífico nem mesmo dentro do Supremo, a ponto de a decisão ter gerado protestos do ministro Marco Aurélio Mello - que votou pela absolvição de João Paulo Cunha e Pizzolato. "Preocupa-me sobremaneira o diapasão que se está dando ao tipo lavagem de dinheiro", disse o ministro durante as discussões. Boa parte dos votos proferidos pelo ministro em relação às imputações de lavagem de dinheiro foi pela absolvição dos réus - mas ele ficou vencido.
Marco Aurélio também ficou vencido em outra inovação criada pelo Supremo: a possibilidade de condenação de um acusado sobre o qual não se tem certeza de que estava ciente da origem ilícita do dinheiro recebido. Em termos jurídicos, o chamado dolo eventual - quando a pessoa assume o risco de receber um dinheiro cuja proveniência é obscura. "Assusta-me brandir que, no caso da lavagem de dinheiro, contenta-se o ordenamento jurídico com o dolo eventual", disse o ministro, um dos mais antigos da Corte.
De acordo com o advogado David Rechulski, do escritório que leva seu nome, o dolo eventual levará as empresas a implementarem políticas de maior cautela. "Mais cedo ou mais tarde, baseado nesse entendimento, o Ministério Público deverá atuar com mais intensidade nos casos de omissão penal relevante, em que haveria o dever legal de agir e a pessoa ficou inerte", afirma. "Principalmente em relação a gestores de fundos de investimento, o risco será grande", diz Rechulski.
O advogado Eduardo Salomão também prevê maior disposição dos juízes de instâncias inferiores em decretar prisões cautelares em casos de investigações por crimes econômicos. A correlação é de difícil comprovação, mas os recentes casos de investigação de fraudes em bancos de pequeno e médio porte, como o PanAmericano e o Cruzeiro do Sul, levaram à prisão provisória apenas o controlador e ex-presidente deste último, Luis Octavio Índio da Costa, solto neste fim de semana. No caso do PanAmericano, todos os ex-administradores respondem a processo penal em liberdade. Vale lembrar: a fraude no PanAmericano veio a público em 2010, antes, portanto, do início do julgamento do mensalão; já a do Cruzeiro do Sul foi tornada pública na era pós-mensalão.
Entre as empresas nacionais a impressão é de que o mercado ainda está em choque com o julgamento do mensalão, dizem advogados. Junta-se a ele a nova Lei de Lavagem de Dinheiro - a Lei nº 12.683, sancionada em 9 de julho deste ano -, que permitirá que qualquer tipo de infração penal seja passível de punição também por lavagem de dinheiro, e está pronto o novo cenário de risco.
Bruno Salles Ribeiro e Fábio Cascione, do escritório Cascione, Pulino, Boulos & Santos Advogados, acreditam que mesmo com as rígidas regras do Banco Central (BC), grandes bancos podem deparar-se com a situação de ver um crime tributário configurar também lavagem de dinheiro, resultando na responsabilização do executivo da instituição financeira. "Isso pode acontecer por terem contato com estruturações financeiras complexas, como middle marketing e private banking, em planejamentos tributários mais arrojados", afirma Ribeiro. "Certamente, as autoridades terão um radar maior em relação a essa possibilidade de interpretação para pressionar os contribuintes", diz.
Bruno Ribeiro interpreta que, de acordo com o julgamento do mensalão, mesmo que o executivo não saiba que determinado bem foi proveniente de uma infração penal, se assumir o risco de usá-lo, o compliance da empresa falhou e ele pode ser acusado de lavagem de dinheiro. "Por ser executivo da companhia, por meio de controles internos, ele deveria saber que usam dinheiro sujo na atividade da empresa", afirma.
De outro lado, o Supremo também entendeu, ao julgar o envolvimento dos executivos do Banco Rural no mensalão, que o descumprimento de regras de compliance previstas pelo regulador, no caso o BC, está sujeito à punição penal, e não apenas a sanções administrativas, como prevê a lei. Ou seja, o dever de agir em casos suspeitos, como prevê a lei, pode levar não só a uma punição na esfera administrativa mas também na esfera penal.
Isso por ter vários efeitos no setor privado. O principal deles é um aumento gigantesco na responsabilidade dos executivos - que podem ser condenados por crime de lavagem mesmo que não tenham cometido fraude ou gerido a empresa de forma temerária ou mesmo que não tenham a menor pista de que, pela instituição que comandam, circulou dinheiro sujo.
"O julgamento do mensalão, já nesse sentido, dá sinal de que, conforme essa lei for interpretada, a responsabilização será grave", diz Johan Albino Ribeiro, assessor jurídico do Bradesco. O diretor da área de compliance de outro grande banco, que preferiu não ser identificado, diz que o sistema financeiro já tem regras sedimentadas e com uma supervisão intensa dos órgãos de controle. "Mas é lógico que, com o julgamento o mensalão, os executivos ficarão mais atentos e talvez mais apreensivos", afirma.
Com isso, na prática, as operações do dia a dia dos bancos e das empresas deverão passar a submeter-se a um controle ainda mais rigoroso, com treinamento de funcionários, reforçando os conceitos de compliance, segundo Johan Albino Ribeiro. "Essa é a ação possível: encontrar os pontos de maior atenção para insistir nos cuidados. Nas relações com fornecedores, por exemplo, conhecer ainda melhor a empresa, saber mais sobre de quem ela recebe e para quem ela paga", afirma.
Em razão desse cenário, a demanda das empresas nos escritórios de advocacia já é de revisão das regras internas para tentar melhorar a efetividade do compliance, segundo Bruno Ribeiro. "Isso será importante inclusive em eventuais processos judiciais porque, muitas vezes, a defesa da empresa acusada de lavagem será a demonstração de um compliance que comprove que todas as cautelas possíveis para evitar o risco foram tomadas", afirma Fábio Cascione.
A evolução na jurisprudência do Supremo em relação à lavagem ainda aguarda confirmação - o que deve ocorrer apenas após a publicação do acórdão (a decisão condenatória com os votos de todos os ministros). Mas o intenso debate entre os ministros quando da votação dos crimes de lavagem do mensalão mostra que, no mínimo, a semente da mudança está plantada.
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domingo, 11 de novembro de 2012
Claus Roxin
Participação no comando de esquema tem de ser provada Folha de Sao Paulo 11 de novembro de 2012
Um dos responsáveis por teoria citada no julgamento do STF, jurista alemão diz que juiz não deve ceder a clamor popular
Claus Roxin, que esteve há duas semanas em seminário de direito penal do Rio
CRISTINA GRILLO
DENISE MENCHEN
DO RIO
Insatisfeito com a jurisprudência alemã -que até meados dos anos 1960 via como participante, e não como autor de um crime, aquele que ocupando posição de comando dava a ordem para a execução de um delito-, o jurista alemão Claus Roxin, 81, decidiu estudar o tema.
Aprimorou a teoria do domínio do fato, segundo a qual autor não é só quem executa o crime, mas quem tem o poder de decidir sua realização e faz o planejamento estratégico para que ele aconteça.
Roxin diz que essa decisão precisa ser provada, não basta que haja indícios de que ela possa ter ocorrido.
Nas últimas semanas, sua teoria foi citada por ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) no julgamento do mensalão. Foi um dos fundamentos usados por Joaquim Barbosa na condenação do ex-ministro José Dirceu.
"Quem ocupa posição de comando tem que ter, de fato, emitido a ordem. E isso deve ser provado", diz Roxin. Ele esteve no Rio há duas semanas participando de seminário sobre direito penal.
Folha - O que o levou ao estudo da teoria do domínio do fato?
Claus Roxin - O que me perturbava eram os crimes do nacional socialismo. Achava que quem ocupa posição dentro de um chamado aparato organizado de poder e dá o comando para que se execute um delito, tem de responder como autor e não só como partícipe, como queria a doutrina da época.
Na época, a jurisprudência alemã ignorou minha teoria. Mas conseguimos alguns êxitos. Na Argentina, o processo contra a junta militar de Videla [Jorge Rafael Videla, presidente da Junta Militar que governou o país de 1976 a 1981] aplicou a teoria, considerando culpados os comandantes da junta pelo desaparecimento de pessoas. Está no estatuto do Tribunal Penal Internacional e no equivalente ao STJ alemão, que a adotou para julgar crimes na Alemanha Oriental. A Corte Suprema do Peru também usou a teoria para julgar Fujimori [presidente entre 1990 e 2000].
É possível usar a teoria para fundamentar a condenação de um acusado supondo sua participação apenas pelo fato de sua posição hierárquica?
Não, em absoluto. A pessoa que ocupa a posição no topo de uma organização tem também que ter comandado esse fato, emitido uma ordem. Isso seria um mau uso.
O dever de conhecer os atos de um subordinado não implica em co-responsabilidade?
A posição hierárquica não fundamenta, sob nenhuma circunstância, o domínio do fato. O mero ter que saber não basta. Essa construção ["dever de saber"] é do direito anglo-saxão e não a considero correta. No caso do Fujimori, por exemplo, foi importante ter provas de que ele controlou os sequestros e homicídios realizados.
A opinião pública pede punições severas no mensalão. A pressão da opinião pública pode influenciar o juiz?
Na Alemanha temos o mesmo problema. É interessante saber que aqui também há o clamor por condenações severas, mesmo sem provas suficientes. O problema é que isso não corresponde ao direito. O juiz não tem que ficar ao lado da opinião pública
Um dos responsáveis por teoria citada no julgamento do STF, jurista alemão diz que juiz não deve ceder a clamor popular
Claus Roxin, que esteve há duas semanas em seminário de direito penal do Rio
CRISTINA GRILLO
DENISE MENCHEN
DO RIO
Insatisfeito com a jurisprudência alemã -que até meados dos anos 1960 via como participante, e não como autor de um crime, aquele que ocupando posição de comando dava a ordem para a execução de um delito-, o jurista alemão Claus Roxin, 81, decidiu estudar o tema.
Aprimorou a teoria do domínio do fato, segundo a qual autor não é só quem executa o crime, mas quem tem o poder de decidir sua realização e faz o planejamento estratégico para que ele aconteça.
Roxin diz que essa decisão precisa ser provada, não basta que haja indícios de que ela possa ter ocorrido.
Nas últimas semanas, sua teoria foi citada por ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) no julgamento do mensalão. Foi um dos fundamentos usados por Joaquim Barbosa na condenação do ex-ministro José Dirceu.
"Quem ocupa posição de comando tem que ter, de fato, emitido a ordem. E isso deve ser provado", diz Roxin. Ele esteve no Rio há duas semanas participando de seminário sobre direito penal.
Folha - O que o levou ao estudo da teoria do domínio do fato?
Claus Roxin - O que me perturbava eram os crimes do nacional socialismo. Achava que quem ocupa posição dentro de um chamado aparato organizado de poder e dá o comando para que se execute um delito, tem de responder como autor e não só como partícipe, como queria a doutrina da época.
Na época, a jurisprudência alemã ignorou minha teoria. Mas conseguimos alguns êxitos. Na Argentina, o processo contra a junta militar de Videla [Jorge Rafael Videla, presidente da Junta Militar que governou o país de 1976 a 1981] aplicou a teoria, considerando culpados os comandantes da junta pelo desaparecimento de pessoas. Está no estatuto do Tribunal Penal Internacional e no equivalente ao STJ alemão, que a adotou para julgar crimes na Alemanha Oriental. A Corte Suprema do Peru também usou a teoria para julgar Fujimori [presidente entre 1990 e 2000].
É possível usar a teoria para fundamentar a condenação de um acusado supondo sua participação apenas pelo fato de sua posição hierárquica?
Não, em absoluto. A pessoa que ocupa a posição no topo de uma organização tem também que ter comandado esse fato, emitido uma ordem. Isso seria um mau uso.
O dever de conhecer os atos de um subordinado não implica em co-responsabilidade?
A posição hierárquica não fundamenta, sob nenhuma circunstância, o domínio do fato. O mero ter que saber não basta. Essa construção ["dever de saber"] é do direito anglo-saxão e não a considero correta. No caso do Fujimori, por exemplo, foi importante ter provas de que ele controlou os sequestros e homicídios realizados.
A opinião pública pede punições severas no mensalão. A pressão da opinião pública pode influenciar o juiz?
Na Alemanha temos o mesmo problema. É interessante saber que aqui também há o clamor por condenações severas, mesmo sem provas suficientes. O problema é que isso não corresponde ao direito. O juiz não tem que ficar ao lado da opinião pública
sexta-feira, 9 de novembro de 2012
STF e foro especializado
Valor de 9 de novembro de 2012
STF cria foro para conflitos federativos
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FacebookTwitterLinkedInGoogle Plus.Por Juliano Basile
De BrasíliaAntecipando-se à tarefa de definir, em última instância, a constitucionalidade das regras sobre a divisão de royalties do petróleo, o Supremo Tribunal Federal (STF) criou uma instância de conciliação de conflitos entre os Estados e abreviou o julgamento de uma ação que o governo do Espírito Santo ingressou contra a lei de repartição de rendas do petróleo.
O Foro Permanente de Mediação de Conflitos Federativos do STF foi criado em setembro pela Corte e passou despercebido por causa do julgamento do mensalão. O Foro é composto por procuradores dos governos dos Estados que vão se reunir periodicamente no STF. Será uma espécie de megamecanismo de conciliação. Os procuradores vão tratar desde problemas pequenos, como transferência de servidores de um Estado para outro, até casos complexos como guerra fiscal, limites territoriais e royalties do petróleo. As tentativas de conciliação serão acompanhadas por um ministro do STF.
Ao todo, o STF tem mais de 5 mil conflitos entre Estados para julgar. "Vivemos numa República Federativa deflagrada", afirmou o ministro Gilmar Mendes, o inspirador da criação do Foro.
A maioria dos processos envolvendo conflitos entre Estados é de causas simples, que podem ser resolvidas por meio de decisões rápidas. Já a questão da divisão dos royalties do petróleo foi apontada, na inauguração do foro, em 21 de setembro, como uma das mais problemáticas que o STF vai ter que enfrentar.
A Corte já definiu um critério que serve como precedente para analisar o problema dos royalties. Em fevereiro de 2010, o STF derrubou o critério de divisão do Fundo de Participação dos Estados (FPE). Na ocasião, a Corte entendeu que a distribuição de recursos arrecadados com o Imposto de Renda, com o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e com a Contribuição de Intervenção sobre Domínio Econômico (Cide) estava desatualizado e, por isso, deveria ser revisto. A divisão do FPE foi estabelecida pela Lei Complementar nº 62, aprovada em dezembro de 1989, com base em informações sobre a situação financeira dos Estados naquela década. Assim, os Estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste ficam com 85% do FPE. Já os do Sul e do Sudeste têm 15%. Para que o FPE não ficasse sem critério, o STF manteve a divisão da Lei Complementar nº 62 até 31 dezembro deste ano, dando um prazo para o Congresso definir novas regras para o fundo.
O cenário ideal para o STF é que Estados e União cheguem a um amplo entendimento sobre todos esses temas envolvendo impostos e benefícios - um pacto. Se não houver pacto, a avaliação da Corte é a de que vão proliferar ações e, mesmo que o STF decida uma a favor de um Estado num caso, entram outras.
Ao derrubar as regras do FPE, a Corte fez uma advertência importante: a de que o primeiro projeto sobre a divisão dos royalties - a chamada Emenda Ibsen, de 2009, - continha critérios semelhantes aos daquele fundo e, por isso, deveria ser considerada inconstitucional. A emenda determinava uma divisão das rendas do petróleo sem diferenciação entre os Estados produtores de petróleo e os que não são.
A advertência da Corte quanto à Emenda Ibsen fez com que Rio e Espírito Santo ingressassem com ações contra os projetos que trataram da divisão dos royalties a partir de 2010. O STF não acolheu essas ações, sob o argumento de que não pode julgar leis nem emendas que ainda não foram definitivamente aprovadas pelo Congresso. Mas, a Corte compreendeu a importância do tema e, numa ação recente do governo capixaba, determinou que o julgamento seja abreviado.
Antecipando-se à aprovação do projeto de lei dos royalties, o governo do Espírito Santo ingressou, em setembro, com ação no STF contra a Lei nº 7.990, de 1989, que determinou o repasse de 25% dos royalties recebidos pelos Estados produtores a municípios. "Não há espaço para que o legislador distribua parcela dessas receitas a Estados e municípios que não são afetados pela exploração de recursos naturais", afirmou o governador Renato Casagrande na ação. O ministro Ricardo Lewandowski foi sorteado relator do caso e decidiu pular o julgamento da liminar pedida pelo governo capixaba. Segundo ele, o caso é tão relevante que deve ser
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STF cria foro para conflitos federativos
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De BrasíliaAntecipando-se à tarefa de definir, em última instância, a constitucionalidade das regras sobre a divisão de royalties do petróleo, o Supremo Tribunal Federal (STF) criou uma instância de conciliação de conflitos entre os Estados e abreviou o julgamento de uma ação que o governo do Espírito Santo ingressou contra a lei de repartição de rendas do petróleo.
O Foro Permanente de Mediação de Conflitos Federativos do STF foi criado em setembro pela Corte e passou despercebido por causa do julgamento do mensalão. O Foro é composto por procuradores dos governos dos Estados que vão se reunir periodicamente no STF. Será uma espécie de megamecanismo de conciliação. Os procuradores vão tratar desde problemas pequenos, como transferência de servidores de um Estado para outro, até casos complexos como guerra fiscal, limites territoriais e royalties do petróleo. As tentativas de conciliação serão acompanhadas por um ministro do STF.
Ao todo, o STF tem mais de 5 mil conflitos entre Estados para julgar. "Vivemos numa República Federativa deflagrada", afirmou o ministro Gilmar Mendes, o inspirador da criação do Foro.
A maioria dos processos envolvendo conflitos entre Estados é de causas simples, que podem ser resolvidas por meio de decisões rápidas. Já a questão da divisão dos royalties do petróleo foi apontada, na inauguração do foro, em 21 de setembro, como uma das mais problemáticas que o STF vai ter que enfrentar.
A Corte já definiu um critério que serve como precedente para analisar o problema dos royalties. Em fevereiro de 2010, o STF derrubou o critério de divisão do Fundo de Participação dos Estados (FPE). Na ocasião, a Corte entendeu que a distribuição de recursos arrecadados com o Imposto de Renda, com o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e com a Contribuição de Intervenção sobre Domínio Econômico (Cide) estava desatualizado e, por isso, deveria ser revisto. A divisão do FPE foi estabelecida pela Lei Complementar nº 62, aprovada em dezembro de 1989, com base em informações sobre a situação financeira dos Estados naquela década. Assim, os Estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste ficam com 85% do FPE. Já os do Sul e do Sudeste têm 15%. Para que o FPE não ficasse sem critério, o STF manteve a divisão da Lei Complementar nº 62 até 31 dezembro deste ano, dando um prazo para o Congresso definir novas regras para o fundo.
O cenário ideal para o STF é que Estados e União cheguem a um amplo entendimento sobre todos esses temas envolvendo impostos e benefícios - um pacto. Se não houver pacto, a avaliação da Corte é a de que vão proliferar ações e, mesmo que o STF decida uma a favor de um Estado num caso, entram outras.
Ao derrubar as regras do FPE, a Corte fez uma advertência importante: a de que o primeiro projeto sobre a divisão dos royalties - a chamada Emenda Ibsen, de 2009, - continha critérios semelhantes aos daquele fundo e, por isso, deveria ser considerada inconstitucional. A emenda determinava uma divisão das rendas do petróleo sem diferenciação entre os Estados produtores de petróleo e os que não são.
A advertência da Corte quanto à Emenda Ibsen fez com que Rio e Espírito Santo ingressassem com ações contra os projetos que trataram da divisão dos royalties a partir de 2010. O STF não acolheu essas ações, sob o argumento de que não pode julgar leis nem emendas que ainda não foram definitivamente aprovadas pelo Congresso. Mas, a Corte compreendeu a importância do tema e, numa ação recente do governo capixaba, determinou que o julgamento seja abreviado.
Antecipando-se à aprovação do projeto de lei dos royalties, o governo do Espírito Santo ingressou, em setembro, com ação no STF contra a Lei nº 7.990, de 1989, que determinou o repasse de 25% dos royalties recebidos pelos Estados produtores a municípios. "Não há espaço para que o legislador distribua parcela dessas receitas a Estados e municípios que não são afetados pela exploração de recursos naturais", afirmou o governador Renato Casagrande na ação. O ministro Ricardo Lewandowski foi sorteado relator do caso e decidiu pular o julgamento da liminar pedida pelo governo capixaba. Segundo ele, o caso é tão relevante que deve ser
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sábado, 3 de novembro de 2012
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