terça-feira, 29 de junho de 2010

Controle das armas

Questão opõe defensores do controle do Estado a arautos do direito individual
HÉLIO SCHWARTSMAN
ARTICULISTA DA FOLHA de São Paulo de 29 de junho de 2010

A controvérsia em torno do porte de armas é essencialmente ideológica. A turma da direita o descreve como um direito individual, enquanto a bancada da esquerda clama por mais controles.
Daí não decorre que não exista também um debate propriamente constitucional. No caso específico dos EUA, a chave do problema é a interpretação da Segunda Emenda, que reza: "Sendo necessária à segurança de um Estado livre a existência de uma milícia bem organizada, o direito do povo de possuir e usar armas não poderá ser impedido".
A ala favorável às armas valoriza mais a segunda oração da frase -"o direito do povo de portar armas não poderá ser impedido"-, impondo assim uma interpretação pró-direitos individuais.
Já os defensores do controle se valem do chamado argumento do direito coletivo. Eles enfatizam o preâmbulo da emenda -"sendo necessária à segurança de um Estado livre a existência de uma milícia bem organizada"- e sustentam que a finalidade desse dispositivo era apenas garantir que os Estados pudessem constituir forças paramilitares para a segurança de todos.
Como o mundo mudou desde o período colonial até os dias de hoje, e as milícias de cidadãos foram substituídas pela Guarda Nacional, já não haveria necessidade de os indivíduos se armarem.
Com a decisão de ontem, a Suprema Corte norte-americana dá um passo decidido rumo à interpretação da posse como direito individual.
Do outro lado do Atlântico, a Inglaterra fez o percurso contrário. A Carta de Direitos de 1689 também trazia um mecanismo que garantia o porte de armas a cidadãos -só os protestantes, mas essa é outra história. À medida, porém, que a tarefa de manter a segurança passou para a polícia, o dispositivo foi caindo no esquecimento, até transformar-se num fóssil.
Hoje, o Reino Unido, como a maioria dos países europeus, tem leis razoavelmente rígidas de controle de armas.
A diferença é que, enquanto a taxa de homicídios por armas de fogo na Inglaterra é de 0,12 por 100 mil habitantes, nos EUA ela é 25 vezes maior, de 2,97 (dados de 2000). Difícil achar que a regulação não tem nada a ver com esses números.

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